Acessar o conteúdo principal
RFI Convida

“Mulheres negras e indígenas representam o feminismo de resistência brasileiro”, afirmam pesquisadoras

Publicado em:

Elas fazem parte do grupo de pesquisas Nexos e passaram 20 dias no Acre acompanhando a rotina de mulheres seringueiras da reserva Chico Mendes. A RFI conversou com Marília Pisani, pesquisadora da Universidade Federal do ABC e Zuleide de Queiróz, da Universidade Regional de Cariri, no Ceará, que vieram a Paris participar do 8° Congresso de Pesquisas Feministas de Países de Língua Francesa.

As pesquisadoras do grupo Nexos Marília Pisani e Zuleide de Queiroz (direita).
As pesquisadoras do grupo Nexos Marília Pisani e Zuleide de Queiroz (direita). RFI
Publicidade

De acordo com Marília Pisani, a ideia não é apresentar uma pesquisa em Paris, mas “estabelecer parcerias e relações internacionais para que nós consigamos sobreviver institucionalmente e mesmo fisicamente em um momento tão conturbado como esse que estamos vivendo no Brasil”. Devido à carência de investimentos na pós-graduação, e com o anúncio recente de um possível grande corte previsto para 2018, as pesquisadoras contam que vieram por conta própria até a França.

“A ideia é que as pesquisadoras francesas tenham interesse no nosso trabalho, mas que elas reconheçam que a violência que a gente está passando no Brasil neste momento também encontra ecos na França. Precisamos encontrar, entre todas as lutas, qual é o solo comum para que isso não seja apenas a apresentação num Congresso e para que essas parcerias sobrevivam ao longo do tempo”, afirmou Marília.

“Queremos iniciar um debate político que nos ajude coletivamente a visualizar o que está acontecendo aqui para entender o contexto de lá e vice-versa. O feminismo não é só uma pesquisa teórica, ele é uma prática de ativismo, e é como militantes que mobilizam a pesquisa que estamos aqui. Porque é através da pesquisa que conseguimos entender”, declarou Marília. “O Nexos vai trazer para a gente uma perspectiva nova de pesquisa na Universidade, onde vamos tentar estabelecer uma relação de pesquisadoras-militantes”, acrescentou Zuleide de Queiróz. 

Dercy Telles: apagada da história

Segundo Marília Pisani, o Nexos é uma “rede de pesquisas” que busca renovar o cenário acadêmico brasileiro, dominado por “latifúndios patriarcais” que limitam os recursos do conhecimento apenas a certos setores e grupos. “Temos quatro coordenadoras, uma no centro-oeste, que tem vínculo com o norte, uma no nordeste, no sul e no sudeste. Somos portanto uma estratégia de sobrevivência num contexto de modelo de pesquisa em que não conseguimos mais nos inserir.”

Dentro dessa perspectiva, o grupo acompanhou a rotina de mulheres seringueiras do Acre durante vinte dias. “Nós fomos convidadas a contar a história do movimento seringueiro pela perspectiva das mulheres. O que a gente descobriu foi que lideranças fundamentais como Dercy Telles, que foi a primeira mulher sindicalista brasileira, assume o sindicato dos seringueiros antes do Chico Mendes, mas há nenhum registro disso nem no Museu dos Seringueiros”.

As pesquisadoras se muniram de equipamentos e foram, por conta própria, até a reserva Chico Mendes para encontrar as mulheres que lá trabalham. “Encontramos a própria Dercy e outras seringueiras para que elas contassem sua história de vida e como eles veem a luta dos seringueiros. O que ficou evidente foi uma desmobilização extrema do movimento hoje e de pouquíssima falta de recurso, mas também de uma força enorme vinda dessas mulheres”, contou Marília. 

“No nordeste, fizemos um levantamento e encontramos 26 comunidades quilombolas. Todas essas comunidades são dirigidas por mulheres negras. Nós temos encontrado o ‘feminismo de resistência’ nessas mulheres, sejam indígenas, negras, sem-tetos nos centros urbanos. Precisamos pensar o feminismo de resistência para enfrentar a realidade atual”, afirmou Zuleide.

Brasil tem protagonismo em lutas sociais

“O Brasil tem atualmente um protagonismo para pensar lutas sociais que brigam por territórios e modos de sobrevivência, como quilombos, indígenas”, afirmou Marília Pisani. “Então, o feminismo no Brasil tem uma articulação com os movimentos sociais, em especial o movimento feminista negro, acho que isso seria o mais interessante que podemos trazer para a França.”

Para Zuleide de Queiróz, as mudanças na política educacional brasileira permitiram a entrada de minorias no ensino superior. “São negros, gays, lésbicas. Isso tem feito com que os pesquisadores voltem seu olhar para esse tipo de estudo e para esses novos jovens. Mas como fazer isso num contexto de um congelamento de recursos na área social?”

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.