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Papa/Lula/Marielle

Papa recebe brasileiros defensores da liberdade de Lula e a mãe de Marielle

O papa recebeu nesta sexta-feira (3) um grupo de brasileiros que denunciam a violação de direitos humanos no Brasil e desaprovam a prisão de Lula. O encontro, que durou cerca de 50 minutos, foi na Casa Santa Marta, no Vaticano, onde o pontífice reside, e ocorreu um dia depois de Francisco ter recebido o ex-embaixador Celso Amorim, a quem entregou uma mensagem escrita abençoando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Da esquerda para a direita: Marinete Silva, Raquel Proner, papa, Paulo Sérgio Pinheiro e Cibele Kuss.
Da esquerda para a direita: Marinete Silva, Raquel Proner, papa, Paulo Sérgio Pinheiro e Cibele Kuss. Gina Marques/RFI
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Gina Marques, de Roma

O grupo era formado por Marinete Silva, mãe da vereadora Marielle Franco (Psol-RJ), assassinada em março, Paulo Sérgio Pinheiro, ex-secretário de Direitos Humanos e ex-coordenador da CNV (Comissão Nacional da Verdade), a advogada Carol Proner, co-autora de um livro que critica a condenação do ex-presidente Lula, e a pastora luterana Cibele Kuss. O encontro foi organizado pelo Movimento Sem Terra (MST Brasil – Itália).

No encontro, Carol Proner entregou dois livros ao pontífice: um sobre o impeachment de Dilma Rousseff e o outro sobre a sentença do juiz Sérgio Moro, que condenou Lula. Já Marinete entregou uma camiseta com a imagem de Marielle Franco. O papa presenteou todos com um terço.

"O papa está muito preocupado com a situação da América Latina e nos disse que está acompanhando tudo de perto. Eu expliquei a ele a forma como a Operação Lava Jato está sendo conduzida, com a flexibilização de provas, de forma seletiva. Falei também do poder midiático não só no Brasil, como na América Latina. A mídia que transforma os juízes em heróis acaba gerando injustiças” disse Carol Proner.

A advogada explicou também que Supremo Tribunal Federal violou um direito universal, que é o da presunção da inocência.

“Expliquei que isso prejudica não apenas o Lula, mas milhares de pessoas que estão na mesma situação, e que têm tido seus direitos violados de forma irreparável. O papa disse que reconhece que é muito grave a inversão de valores e que hoje as pessoas precisam provar que são inocentes. Mas o Santo Padre não fez referência específica a Lula ou ao Brasil", afirmou Carol Proner.

Paulo Sérgio Pinheiro levou ao papa um documento feito por várias organizações de defesa dos direitos humanos sobre as ameaças à democracia no Brasil.

“Falei que nos últimos dois anos a proteção dos direitos humanos no Brasil sofreu um dramático retrocesso. Não só em relação às garantias constitucionais para os gastos sociais. A famosa emenda constitucional do congelamento das despesas de educação e saúde por 20 anos é uma enorme irresponsabilidade. O relator especial para pobreza extrema denunciou isso de maneira bastante clara. Além disso, abandonaram as agendas de proteção dos grupos marginalizados, por exemplo, os afrodescendentes, que constituem a maioria da população, de acordo com o último censo, e também de outras minorias, como os povos indígenas, crianças e adolescentes da periferia. O resultado destas ações é o crescente desemprego e o mal estar social”, disse ex-coordenador da CNV.

Pinheiro também mencionou ao papa um artigo que saiu em 1° de agosto no jornal Osservatore Romano, que afirma que nos últimos dois anos a pobreza no Brasil dobrou de 5 milhões para 10 milhões de pessoas.

“Falei também da violência em todas as dimensões. Continua a temporada de caça aos jovens e adolescentes nas periferias da cidade, especialmente afrodescendentes. Achávamos que estávamos a caminho da consolidação da democracia, mas o golpe do impeachment barrou isso. Segundo o relatório de uma agenda de monitoramento respeitável, em 2017 o Brasil foi o país que mais matou defensores dos direitos humanos. Isso demonstra que aqueles que falam pelos marginalizados assumem riscos enormes, como foi o caso de Marielle. Reconstituir o dialogo e confiança nas instituições vai ser uma tarefa extremamente complexa no Brasil e a responsabilidade é das classes sociais e da elite que aceitaram o golpe e promoveram este retrocesso ” ele disse.

Paulo Sérgio Pinheiro também cumprimentou o papa pela condenação da pena de morte.

“Para os defensores de direitos humanos no mundo inteiro, isso é fundamental. Nem nas Nações Unidas existe uma tratado de denúncia que condene a pena de morte”.

A emoção de Marinete

Marinete Silva disse que ficou emocionada ao encontrar o papa.

“Ele me abraçou e beijou. O papa já tinha me ligado depois da execução de Marielle. Em seguida ele mencionou Marielle no Angelus. Ele é um líder generoso. Hoje falei para ele que o caso está caindo no esquecimento. Minha vinda aqui em Roma tem este sentido: não deixar ao descaso, denunciar a indiferença e combater o silêncio. Estou transformando o meu luto em luta”, desabafou.

Fundamentalismo cristão

A pastora luterana Cibele Kuss falou com o papa sobre a sinergia entre os atos de violência religiosa e política no Brasil, acentuada depois do impeachment de Dilma Rousseff. Ela conversou também sobre o fundamentalismo cristão.

“No Brasil o papel da religião não pode ser subestimado nem para o bem, nem para o mal. Vivemos uma violência política, o assassinato de Marielle Franco é emblemático. Antes disso, em 2017, houve ataques com armas de fogo à caravana de Lula no Rio Grande do Sul e recentemente ao acampamento Lula Livre em Curitiba. Todos estes fatos são quase sempre acompanhados por narrativas fundamentalistas cristãs. O nome de Deus e da bíblia foram instrumentalizados no impeachment para contrastar a democracia. Além disso, houve ataques a terreiros e a casas dos guarani e caiová. Atacar terreiros, casas de reza, é querer matar as ideias destas pessoas, enfraquecer o seu processo de resistência, e é também um ato de racismo contra os afrodescendentes e contra os índios. Hoje o nosso desafio, enquanto movimento ecumênico e igrejas cristãs, é lutar contra a afirmação de uma teologia herética, o deus capitalismo, a instrumentalização de deus, que seja capaz de enfrentar o deus mercado, o racismo e a injustiça social, o deus capitalismo, a instrumentalização de deus. O papa compartilhou nossas preocupações”, disse Kuss.

 

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