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Planeta Verde

Aldeias pré-coloniais indicam maior ocupação da Amazônia antes do descobrimento

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A ocupação da Amazônia antes da chegada dos europeus na América do Sul pode ter se estendido a uma zona bem maior do que se pensava. É o que sinaliza a recente descoberta de uma equipe de pesquisadores do Reino Unido e do Brasil, que identificou resquícios de 81 sítios arqueológicos ao longo de 1.800km na borda sul amazônica, desde o Acre até o rio Xingu.

Aldeias são conectadas por estradas, o que indica a comunicação entre elas.
Aldeias são conectadas por estradas, o que indica a comunicação entre elas. Divulgação
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As aldeias mais próximas ao rio chegam a ter 1km de extensão, conectadas entre si por estradas rudimentares, como mostram os rastros cravados no solo, chamados de geoglifos. O arqueólogo gaúcho Jonas Gregório de Souza, da universidade britânica de Exeter, explica que, nas últimas décadas, as descobertas de grandes sítios arqueológicos no Acre, na Bolívia e no alto rio Xingu haviam levantado a suspeita da existência pré-colombiana de populações sedentárias em uma área ainda mais vasta. Jonas é o autor principal do artigo publicado na revista científica Nature Communications, sob a coordenação do uruguaio José Iriarte, do Departamento de Arqueologia da mesma instituição inglesa.

Foto de satélite mostra contornos de aldeia que data de 1450, na Amazônia.
Foto de satélite mostra contornos de aldeia que data de 1450, na Amazônia. IM amazonia

“Havia um vazio na região das cabeceiras do alto rio Tapajós, que se encontra entre as regiões que já haviam sido pesquisadas. Existe a hipótese de que talvez toda essa região sul da Amazônia pudesse ter sido ocupada por populações que construíram sítios arqueológicos semelhantes aos geoglifos”, afirma. “Fomos então a essa região e provamos que toda a borda sul da Amazônia estava densamente povoada no período pré-colonial.”   

As análises de laboratório feitas com as amostras do solo mostram que os geoglifos datam de entre os anos 1.400 e 1.450 – portanto, de logo antes da “descoberta” do continente americano pelo navegador Cristóvão Colombo. “Nesse período, de alguns séculos antes do contato, a região estava densamente ocupada por esses grupos que construíam sítios semelhantes. Eram grupos provavelmente sedentários que viviam em aldeias fortificadas. A valeta que cerca o sitio teria uma função defensiva”, relata o arqueólogo.

Terra preta: um sinal de uso antigo do solo

No local, os pesquisadores identificaram uma amostra concreta do quanto essas populações estavam estabelecidas: a terra preta, um solo criado pelo homem com acú
mulo de resíduos orgânicos, para favorecer a fertilidade da área. Essa formação é um ponto em comum entre os sítios arqueológicos de toda a Amazônia, e indicam a que ponto a floresta já era, desde então, explorada pelo homem para a agricultura. A grande diferença é que, na época, o plantio era para a subsistência.

“Essas populações conseguiram viver durante séculos, em aldeias permanentes, e é óbvio que elas tiveram um impacto no ambiente. As florestas que se encontram perto dos sítios arqueológicos têm espécies como a castanha-do-pará, palmeiras, cacau. Ou seja, árvores semidomesticadas”, aponta Jonas Gregório de Souza. “Provavelmente, a presença dessas árvores reflete o uso pelas populações pré-colombianas. A floresta que vemos hoje carrega uma herança do que essas populações cultivaram e manejaram no passado.”

Valas cravadas no solo indicam mecanismo de defesa das aldeias pré-colombianas.
Valas cravadas no solo indicam mecanismo de defesa das aldeias pré-colombianas. Divulgação

Imagens por satélite

Em uma região gigantesca como a Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, uma das maiores dificuldades é localizar onde podem estar os resquícios arqueológicos no solo. Ironicamente, foi graças ao desmatamento intensivo no Mato Grosso, nos últimos 20 anos, que a equipe conseguiu mapear e identificar a área a ser pesquisada, com imagens de satélite recolhidas por programas como Google Earth e o Zoom Earth. Mas Jonas ressalta que tecnologias mais sofisticadas já permitem aos cientistas não depender das zonas desmatadas.

“A gente não precisa esperar o desmatamento chegar porque hoje há tecnologias como o LIDAR, um equipamento que, através de laser, consegue mapear o terreno sob a floresta. A gente consegue obter mapas detalhados de topografia do terreno mesmo em áreas cobertas pela floresta e, assim descobrir sítios arqueológicos”, indica o pesquisador, que ressalta, no entanto, os custos elevados da ferramenta.

Pesquisadores identifcaram áreas a serem exploradas por programas como Google Earth.
Pesquisadores identifcaram áreas a serem exploradas por programas como Google Earth. Divulgação

O próximo passo da equipe é investigar em detalhes os sítios encontrados no Acre e retornar aos sítios maiores do Mato Grosso, para entender melhor como foram construídos, que tipo de culturas havia nas redondezas e tentar determinar por quanto tempo as populações viveram nos locais. Além dos especialistas da universidade britânica, o grupo conta ainda com pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e das universidades brasileiras Unemat e Federal do Pará (UFPA).

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