Le Monde: BNDES virou “ferramenta de geopolítica e influência das grandes companhias”
O jornal francês Le Monde que chegou às bancas nesta quarta-feira (24) traz uma reportagem sobre a onipresença dos financiamentos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) nos grandes projetos não só no Brasil, como na América Latina e na África. O diário constata que o banco, que deveria apoiar o desenvolvimento do país e das pequenas e médias empresas, hoje “se transformou em ferramenta de geopolítica e influência”, principalmente a serviço das grandes companhias.
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O texto começa citando uma série de obras com participação do BNDES, para mostrar até que ponto o braço financeiro do Estado brasileiro está presente em projetos tão diversos quanto a usina de Belo Monte, o porto de Mariel, em Cuba, ou nas pesquisas contra o vírus zika. Le Monde escreve que o “poder de fogo” da instituição se compara ao do Banco Mundial.
No entanto, ao longo dos anos, depois da sua fundação, em 1952, o banco acabou atendendo mais às grandes companhias, como a Odebrecht, do que aos projetos menores. “No início dos anos 2000, esse objetivo parecia pertinente: o Brasil, rei dos emergentes, queria se impor no mundo”, explica a correspondente do jornal em São Paulo, Claire Gatinois. “Mas agora que o país se afunda na recessão, que a inflação disparou, que o crédito secou e as pequenas empresas estão na agonia, os especialistas se questionam: o que o BNDES está fazendo para os empreendedores, que mais precisam dele?”, diz o texto.
Corrupção e financiamento de “amigos”
A reportagem esclarece que, dos R$ 136 milhões emprestados em 2015, 66% foram para grandes companhias – das 1.000 maiores empresas do país, 78% são financiadas pelo BNDES. Mas, com a crise, 28% dos créditos foram cortados, com consequências que expuseram a que ponto “o banco tomou um espaço desmedido na economia brasileira”: os empréstimos pela instituição representam 21% do total do mercado.
“A onipresença do BNDES é ainda mais constrangedora porque se dirige essencialmente a grandes grupos que, a princípio, não precisariam dessas subvenções”, afirma a matéria, lembrando que a relação dúbia entre a economia e o governo favorece a corrupção. Juan Carlos Rodado, economista do banco Natixis que analisa a América Latina, constata ao Le Monde que o “banco acaba distribuindo dinheiro para os amigos”.
O jornal destaca que, para a maioria dos críticos à gestão do banco de desenvolvimento, a instituição foi “pervertida” após a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência, quando floresceram os financiamentos em países latino-americanos e africanos, em geral em parceria com construtoras que “hoje estão manchadas no escândalo de corrupção da Petrobras”. No entanto, a reportagem observa que, para alguns especialistas, como o cientista político Mathias de Alencastro, os “deslizes” podem ter começado bem antes, na época da onda de privatizações no governo Fernando Henrique Cardoso.
“Qualquer que seja a origem das derivas, o BNDES parece desarmado e impotente diante da crise econômica”, verifica o jornal francês.
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