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Brasil/Comissão da Verdade

"Nunca quis sair do Brasil", diz Salmeron, físico paulista exilado em Paris

O físico nuclear Roberto Salmeron, 92 anos, diretor emérito da École Polytechnique francesa, fugiu da ditadura e veio para a França em 1966. Para ele, a divulgação do relatório da Comissão da Verdade nesta quarta-feira (10), em Brasília, é essencial. “O povo precisa conhecer sua própria história, senão ela pode se repetir”, diz o cientista.

O físico brasileiro Roberto Salmeron
O físico brasileiro Roberto Salmeron Daiane Sousa/UnB Agência
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Entrevista concedida à jornalista Letícia Constant

A carreira profissional do físico Roberto Salmeron dispensa apresentações. Ele deixou o Brasil pela primeira vez em 1953, quando se mudou para Manchester, onde fez seu doutorado. Em seguida, passou pelo CERN (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear), na Suíça, onde ficou por oito anos. As saudades do Brasil falaram mais alto e ele decidiu voltar ao país para participar da criação da Universidade de Brasília. A perseguição durante a ditadura, entretanto, falou mais alto, e Sameron voltou para a Europa. Para nunca mais voltar. “Nunca quis sair do Brasil”, disse o físico em entrevista à RFI. “Eu acho muito importante divulgar todos esses documentos para que a população esteja consciente.”

O físico tem dúvidas sobre a punição dos responsáveis pelos crimes contra a humanidade cometidos naquele período. O relatório identificou 377 responsáveis, dos quais 196 estão vivos, mas a lei da Anistia, promulgada em 1979, beneficiou os torturadores, transformando o Brasil no único país da América do Sul a não punir os culpados pelas atrocidades cometidas durante a ditadura militar.

“Os militares no Brasil são sempre muito fortes. Não sei se a justiça poderá ser feita contra os militares. Isso é pouco provável, mas, por outro lado, acho que tudo que aconteceu durante a ditadura deve ser divulgado. A nova geração precisa conhecer essa história. Foi um período muito dramático para nós no Brasil. Por exemplo, eu estou aqui na França porque fui colocado para fora. Nunca quis morar fora do Brasil. Minha mulher e eu nunca quisemos morar fora do Brasil. Mas não tive outra alternativa”, diz.

Salmeron lembra de um episódio marcante, na época em que ainda trabalhava na universidade. “A Universidade de Brasília foi invadida pelas tropas do exército, num domingo à noite. Na segunda-feira de manhã, quando chegamos para trabalhar, fomos proibidos de entrar no terreno da universidade. Eu, então, expliquei aos militares que tinha muita responsabilidade no Instituto de Ciências, e que no Instituto de Biologia havia animais que precisavam ser tratados e alimentados, e que um dos professores precisava entrar no laboratório”, explica.

As histórias do período de chumbo são contadas em seu livro “A universidade interrompida”, produzido pela editora da Universidade de Brasília. “Nessa obra eu conto a história da universidade, da invasão da universidade, e o regime militar na universidade. Inclusive um dos meus estudantes de Física desapareceu. Ele foi preso e desapareceu. Nunca mais tivemos notícias dele. Desapareceu.”

Imprensa francesa lembra que país não puniu algozes

Os sites dos maiores jornais franceses deram destaque à divulgação do relatório da Comissão da Verdade divulgado em Brasília. A imprensa francesa lembra que 434 vítimas morreram ou desaparecem durante o período, como anunciou o coordenador do CNV, Pedro de Abreu Dallari. A presidente Dilma Rousseff, que acompanhou a apresentação, chorou ao ouvir as conclusões.

Cerca de 30 anos depois do fim da ditadura, “a verdade vem oficialmente à tona”, lembra o Le Figaro. O documento também mostra que, dos 377 responsáveis por crimes contra a humanidade cometidos entre 1946 e 1988, apenas 196 estão vivos. O Libération também lembra que o Brasil é o único país da América do Sul que não julgou os crimes cometidos durante os anos de chumbo, por conta da lei de Anistia votada em 1979.

03:49

Entrevista com Roberto Salmeron

 

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