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Pesquisadora analisa regulações de drogas no Brasil dentro do contexto internacional de 1920 a 1950

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Nos últimos anos, uma epidemia de abuso de opiáceos vem desenvolvendo pelo mundo, uma consequência direta da complexa história da regulação internacional do uso de drogas. A brasileira Mariana Broglia desenvolve na França um doutorado a respeito da implantação e estabilização desse setor no Brasil entre os anos 1920 e 1950.

A pesquisadora Mariana Broglia
A pesquisadora Mariana Broglia © RFI
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“A pesquisa gira em torno das políticas internacionais e nacionais de controle sobre drogas”, conta Broglia. “Nunca se buscou proibir as drogas que causassem dependência. Então a gente vê, no caso das crises sanitárias, dos opiáceos, drogas justamente derivadas sintéticas do ópio, que são consumidas, fabricadas e circulam dentro de um quadro legal. A questão sempre foi de saber como definir esses usos médicos, quem pode dar e ter acesso a essas drogas, sob quais condições, etc”, explica.

Ela também destaca que as epidemias de abuso levam à reflexão, reabilitando um “processo histórico esquecido com o paradigma da guerra às drogas”.

“No início do século XX, houve a formação de um sistema internacional de controle de entorpecentes na Liga das Nações nos anos 1920, que buscava regular o mercado legal internacional das drogas com um sistema de convenção de que as drogas poderiam circular para responder a finalidades médicas e científicas”, lembra Mariana. “Então tudo que era uso recreativo ou outros eram proibidos”.

“O que é interessante é que quando essa política de regulação do mercado legal internacional das drogas, existe uma repartição do mercado internacional na mão de alguns países, por exemplo, que vão ser os países produtores, os países fabricantes e os países consumidores”, relata.

“Os países fabricantes são os que detêm as indústrias farmacêuticas, como os europeus, os Estados Unidos ou o Japão. Então, eles são os que detêm a indústria farmacêutica e que vão, de alguma forma, guardar a mais-valia desse mercado internacional das drogas”.

“Mas esse sistema internacional de controle dos entorpecentes tinha uma dimensão super utopista, que era o fato de achar que ele ia conseguir resolver o problema da toxicomania agindo sobre a oferta mundial dos entorpecentes”, explica a pesquisadora.

Farmácias 

Broglia observa que, a partir de 1910, a origem do tráfico ilícito era associada a essas indústrias farmacêuticas que produziam drogas em grandes quantidades e que não conseguiam ser consumidas inteiramente dentro de um quadro médico e científico. Assim, o excesso acaba sendo canalizado para usos ilegais. A regulação da fabricação dos entorpecentes começa nos anos 1930.

“O Brasil ocupa um lugar específico, a de um país consumidor”, de acordo com a pesquisadora. “Toda a droga que entra no Brasil vem de importação. Houve grandes crises sanitárias ligadas ao abuso de entorpecentes, como nos anos 20 e 30, de surtos ligados ao consumo de cocaína", lembra.

“Nessa época, essa cocaína cheirada vinha desviada da farmácia; era da Bayer ou Merck. Então o Brasil cria, nesse contexto uma Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes, que vai virar nos anos 1940, o Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina, para regular esse mercado legal das drogas, aumentando um controle sobre os profissionais de saúde”, diz.

"Em seguida, o Estado delega uma parte do monopólio para algumas categorias sócioprofissionais da saúde, por exemplo, os profissionais de saúde ou alguns estabelecimentos, como as farmácias. E, ao mesmo tempo, ele reforça o controle exercido sobre esses profissionais”, explica.

Para evitar abusos diante do acesso privilegiado a essas drogas, os profissionais passam a ser obrigados a prescrever entorpecentes em receituários médicos. A legislação é dissuasiva e punitiva.  “A partir dos anos 1930, acontecem batidas de polícia dentro de farmácias, estabelecimentos com estatuto ambivalente e ambíguo”. As farmácias eram obrigadas a armazenar morfina, cocaína em pó, extrato de maconha e outras substâncias para o próprio exercício da prática terapêutica.

Os farmacêuticos passaram a fazer resistência, exigindo que o controle passasse a ser feito por pessoas especializadas ou inspetores sanitários, resultando nos anos 1960, nos conselhos regionais e federais de farmácia.

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