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Rendez-vous cultural

"Chumbo": HQ lançada na França retoma a ditadura no Brasil a partir de uma saga familiar

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O quadrinhista franco-brasileiro Matthias Lehmann está lançando o álbum “Chumbo” na França, pela editora Casterman. O livro é francês, mas a história se passa no Brasil e o título, em português, faz referência aos anos de chumbo da ditadura no país. 

Capa de "Chumbo", história em quadrinhos de Matthias Lehmann. O álbum conta a história da família Lehmann em Minas Gerais ao longo de várias décadas.
Capa de "Chumbo", história em quadrinhos de Matthias Lehmann. O álbum conta a história da família Lehmann em Minas Gerais ao longo de várias décadas. © Patricia Moribe
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Por Patrícia Moribe

Com 360 páginas, “Chumbo” segue a história da família Wallace, mais precisamente dos irmãos Ramires e Severino, de 1937 até 2003. “Severino, jornalista e depois escritor, era comunista durante a ditadura. Já Ramires, ao contrário, é reacionário, próximo dos militares”, explica o autor. “Como a história acontece em Belo Horizonte, você acompanha a evolução da cidade e da sociedade, passando pela ditadura”.

Cena de "Chumbo", de Matthias Lehmann", retratando uma noite em Belo Horizonte.
Cena de "Chumbo", de Matthias Lehmann", retratando uma noite em Belo Horizonte. © Matthias Lehmann

Nascido na região parisiense em 1978, Lehmann é filho de uma brasileira com um francês. “Minha mãe veio morar na França há 40 anos e ela tinha sempre uma saudade tremenda da família, do Brasil, de Minas Gerais. E de certo modo, ela transmitiu esse sentimento para mim e minhas irmãs. Então a gente cresceu com essa cultura brasileira muito forte, esse apego pelo Brasil”, explica o artista.

Em entrevista ao jornal francês Libération, ele conta que já tinha essa ideia há pelo menos quinze anos, mas adiava escrever o livro por causa do trabalho de documentação. Porém, a chegada da extrema direita ao poder apressou as coisas. "A eleição de Jair Bolsonaro gerou um pensamento revisionista da ditadura e muitos começaram a pensar que no tempo dos militares era melhor", disse o autor. "Então, eu resolvi investigar essas questões, me apoiando em fatos históricos, sobretudo a tortura", completa. 

“Chumbo” levou quatro anos para ser concluído. Os personagens são inspirados na própria família do autor. “Era um jeito de eu explorar a história brasileira, entender melhor o que é o Brasil e qual o meu relacionamento com esse país”, diz Lehmann.

As fontes de pesquisa e inspiração foram “inúmeras”, relata o quadrinista. “Você começa a ler uma coisa, o livro vai falar de outra coisa e então isso não acaba.” Foram livros de história e de literatura brasileira, como Mario de Andrade, Guimarães Rosa e Graciliano Ramos. Ele cita ainda livros sobre a imprensa brasileira, passando inevitavelmente por Chatô – o poderoso Assis Chateaubriand, magnata da imprensa brasileira, fundador dos Diários Associados.

"Chumbo" conta a história da família Wallace em Minas Gerais, de 1937 a 2003.
"Chumbo" conta a história da família Wallace em Minas Gerais, de 1937 a 2003. © Matthias Lehmann

“Um livro que me marcou muito foi ‘Os senhores das Gerais: os Novos Inconfidentes e o golpe militar de 1964’, de Heloísa Starling, pois fala justamente da influência dos empresários e da direita na organização da ditadura, com foco em Minas Gerais”, cita Lehmann. Ele também destaca “O Desatino da Rapaziada”, de Humberto Werneck. “O livro fala muito dos escritores, dos jornalistas de Minas Gerais, da boêmia, isso tudo foi muito interessante para eu construir o personagem do Severino, por exemplo”.

Matthias Lehmann cresceu consumindo os quadrinhos franco-belgas, foi descobrindo muitos autores pelo caminho, mas cita como influência importante os trabalhos em preto e branco de autores inovadores como os americanos Robert Crumb e Art Spiegelman.

Matthias Lehmann, autor de "Chumbo".
Matthias Lehmann, autor de "Chumbo". © Isabelle Franciosa

Ele descobriu outra pepita em suas pesquisas, “A Linha do Tempo do Design Gráfico no Brasil”, de Chico Homem de Mello, da extinta editora Cosac & Naify. “Esse livro tem tudo, muita documentação, visual, tudo. E foi muito útil para mim porque cada capítulo de ‘Chumbo’ acontece em dez anos, acompanhando a evolução da moda, da arquitetura, de tudo isso”.

Lançado na França, com repercussão na imprensa, o autor espera que Chumbo (Ed. Casterman) possa ser traduzido em breve: "se não sair no Brasil, estará incompleto". 

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