Massa ou Milei? Eleitores indecisos podem definir futuro da Argentina no domingo
Publicado em:
Ouvir - 04:37
A 48 horas da eleição mais tecnicamente empatada dos últimos 40 anos, desde a recuperação da democracia, os argentinos vão escolher neste domingo (19) o próximo presidente do país, uma decisão que pode alterar a matriz da economia. Uma Argentina polarizada alinha-se atrás da mudança radical que significa a vitória do ultraliberal Javier Milei ou da continuidade do peronismo no poder que representa a vitória de Sergio Massa.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
As urnas vão revelar o tipo de modelo econômico e político que a Argentina terá pelos próximos quatro anos. Se continua o atual ou se adota um modelo liberal. Em questão, está o tamanho e o papel do Estado.
“São dois modelos de país, sobre como se administra a máquina pública. Um modelo mais privatizado, por parte de Javier Milei, ou um Estado com vocação intervencionista, pelo lado de Sergio Massa”, explica à RFI a analista política Shila Vilker, diretora da consultora Trespuntozero.
A média das 12 pesquisas às quais a RFI teve acesso deixa Javier Milei com 44,6% das intenções de voto, contra 42,6% de Sergio Massa, uma diferença de dois pontos, dentro da margem de erro. Os votos voláteis e os indecisos rondam os 10%.
A sondagem da consultora Giacobbe & Asociados, por exemplo, indica que 48,3% votarão em Javier Milei, 43,3% em Sergio Massa e 5,5% estão indecisos. Mas o especialista em opinião pública Jorge Giacobbe, diretor do escritório, admite que as pesquisas não têm conseguido medir bem o eleitorado porque pouca gente aceita respondê-las. Também aponta a dificuldades para se chegar a determinados segmentos sociais.
O prazo para divulgação pública de pesquisas acabou há uma semana (dia 10). Depois disso, já houve um debate eleitoral (12) e uma intensificação das campanhas, agressivas dos dois lados.
No primeiro turno, em 22 de outubro, o candidato Javier Milei obteve 30% dos votos. Para Jorge Giacobbe, tudo o que o candidato ultraliberal cresceu desde então vem de eleitores contrários ao chamado ‘kirchnerismo’, a corrente política liderada pela vice-presidente Cristina Kirchner, aliada de Sergio Massa.
Para esses novos eleitores, Javier Milei não é a melhor opção, mas é a única que permite uma mudança. “Não é que Milei lhes represente a esperança. Entre o fracasso atual e a loucura, preferem a loucura. Milei é a única ferramenta que lhes restou para parar o kirchnerismo”, afirma Giacobbe.
A analista Shila Vilker indica que, no primeiro turno, os indecisos definiram o voto nos últimos quatro dias, tendência que deve se repetir nestas horas. Para a especialista, os novos eleitores de Javier Milei são pragmáticos.
“É um voto com raciocínio pragmático. Entre mudar ou continuar, o único que pode mudar é Milei”, resume.
Impacto do debate
No debate entre candidatos no domingo passado, Massa foi muito mais sólido, preparado e profissional do que Milei. Os próprios eleitores do opositor reconhecem essa superioridade no debate.
Porém, para boa parcela dos eleitores, Massa também foi arrogante e estrategista contra um Milei que parecia inocente diante das artimanhas políticas.
Curiosamente, as pessoas identificam nessa falta de profissionalismo uma autenticidade, alguém que vem de fora da política. Esse é justamente um dos lemas de Milei: ser contra a casta política.
O analista Jorge Giacobbe acredita que o debate não tenha alterado o panorama eleitoral; Massa ganhou o debate, mas não os votos. “Do ponto de vista do voto, nenhum dos dois ganhou”, avalia Giacobbe.
“Medimos o resultado do debate. Há uma avaliação majoritária de que Massa ganhou o debate, mas, ao mesmo tempo, o comportamento eleitoral se manteve. Não houve uma incidência sobre o voto”, concorda Vilker.
Intensificação da campanha
As duas campanhas apelam para a estratégia do medo. Além de candidato a presidente, Sergio Massa é o atual ministro de uma Economia com 142,7% de inflação nos últimos 12 meses e 42% de pobreza. Sem trunfos para exibir, ele busca advertir a população que embarcar numa aventura com Javier Milei significaria um pulo no precipício.
Por sua vez, o economista ultraliberal também apela ao medo quando alerta que continuar com Massa poderá levar o país à hiperinflação e torná-lo uma Venezuela.
Quem usa o transporte público em Buenos Aires vê no visor de cobrança um aviso de que a tarifa paga, se não tivesse subsídio, custaria 20 vezes mais. O alerta é um recado de que Milei se opõe aos subsídios. Na campanha de Massa há mais peças publicitárias contra Milei do que a favor do próprio peronista.
Essas propagandas usam declarações anteriores de Milei para apontar que, se o libertário ganhar, haverá um mercado de venda de órgãos, o porte de armas será liberado, a Educação e a Saúde, hoje gratuitas, serão pagas, entre outras medidas.
Estratégias de apoio
Com o respaldo do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), a candidata derrotada no primeiro turno Patricia Bullrich (23,8%) manifestou o seu apoio a Javier Milei. A decisão, no entanto, dividiu a principal coalizão opositora, Juntos pela Mudança. Para alguns líderes dessa coligação, especialmente o centenário partido União Cívica Radical, a extrema-direita de Javier Milei é um limite intransponível.
Para aumentar esse racha e seduzir os descontentes, Sergio Massa tem dito que vai formar um governo de união nacional, a exemplo da estratégia de Lula, no Brasil, ao tentar formar uma frente democrática em 2022.
O analista Jorge Giacobbe explica que, sendo agressivo, Javier Milei conseguiu os 30% dos votos no primeiro turno. O problema é que também conseguiu que 70% não votassem nele, dos quais muitos ficaram com medo.
Os apoios de Macri e de Bullrich ajudaram Javier Milei a obter a maior parte dos votos da candidata derrotada e a passar a imagem de que 'aquele louco agora ficou menos louco' porque agora tem, por trás, líderes que o contêm.
Como Patricia Bullrich representava a mudança, Milei incorporou o lema “Mudança x Continuidade”, pondo para segundo plano o lema principal até o primeiro turno “Casta x Anti-casta”, no qual o outsider concluía que “uma mudança no país não é possível com a mesma casta política de sempre”.
“A demanda de mudança está ganhando a disputa”, observa Shila Vilker, que realiza a última pesquisa antes da votação de domingo, a ser divulgada apenas para os clientes.
NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.
Me registro