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Linha Direta

Lula deve focar no governo e deixar punição de Bolsonaro com a justiça, dizem especialistas

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Com o avanço das investigações na direção do ex-presidente, aliados políticos de Jair Bolsonaro já se movimentam para herdar protagonismo entre eleitores de direita. No ninho petista, o desafio é aproveitar vento favorável e tocar projetos no Legislativo.

Lula responsabiliza Bolsonaro, derrotado no segundo turno das eleições de outubro, de provocar e estimular os ataques.
Lula responsabiliza Bolsonaro, derrotado no segundo turno das eleições de outubro, de provocar e estimular os ataques. AP - Bruna Prado
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Nos corredores de Brasília, muito se discute que resultados políticos uma eventual prisão do ex-presidente poderia trazer para o país e para o próprio Bolsonaro, se ele teria seu futuro político comprometido ou, ainda, se conseguiria alimentar seus seguidores com a narrativa da perseguição. Interlocutores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva avaliam que, seja qual for o desdobramento das investigações, se houver uma punição ao ex-presidente, ela deve vir das mãos da justiça e não do Executivo.

O analista político Cláudio Couto, da FGV/SP, disse à RFI que os ataques contra as sedes dos três poderes em Brasília deram certo fôlego ao governo do PT, mas que Lula precisa mostrar serviço, para além do discurso contra os adversários. "Os episódios do dia 8, como deslegitimaram a oposição bolsonarista, acabaram, por tabela, facilitando a vida do governo no sentido de ganhar mais apoio, mais legitimidade. Agora é claro que, se o governo ficar se ocupando demais desse assunto, de tentar ir atrás das figuras que produziram a intentona, acho que o governo começa a perder o rumo", disse Couto.

"A coisa está andando no STF, que tem o maior interesse em fazer isso andar. O procurador-geral, quem diria, Augusto Aras, que nunca se mexeu, acordou da longa hibernação e resolveu agir nesse caso, inclusive indiciando Bolsonaro, colocando-o dentro do inquérito”, aponta.

Para Couto, esse avanço dá a Lula a possibilidade de não perder mais tempo com o assunto, em especial na sua relação com o Congresso. O momento é favorável, avalia o cientista político, para o Executivo levar adiante agendas próprias, como a Reforma Tributária.

Baixar a guarda

Couto salienta que, não à toa, os petistas agora sinalizam que não pretendem levar adiante a CPI dos atentados. O próprio presidente se colocou contra a Comissão de Inquérito, em entrevista à GloboNews nessa quarta-feira (18), quando criticou a politização das Forças Armadas. "Enquanto estiver servindo às Forças Armadas, à Advocacia-Geral da União, ao Ministério Público, essa gente não pode fazer política. Tem que cumprir com a sua função constitucional, pura e simplesmente", afirmou Lula.

O presidente também disse que faltou inteligência no monitoramento dos bolsonaristas. "Nós temos inteligência do GSI, da Abin, do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, ou seja, a verdade é que nenhuma dessas inteligências serviu para avisar ao presidente da República que poderia ter acontecido isso. Se eu soubesse na sexta-feira (6) que viriam 8 mil  pessoas aqui, eu não teria saído de Brasília. Eu saí porque estava tudo tranquilo”, argumentou.

Espólio bolsonarista

Entre os políticos e partidos bolsonaristas, já se percebe movimentação para ver quem irá herdar o espólio político do ex-presidente. Chamaram a atenção, por exemplo, falas recentes do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) tentando jogar a responsabilidade pelos ataques ao governo Lula.

Essas atitudes são mostras da situação delicada de Bolsonaro, que continua no Estados Unidos e ainda analisa se vale a pena retornar ao Brasil. Mesmo que não venha a ser preso, o ex-presidente pode ficar inelegível, explicou à RFI o advogado Antônio Ribeiro, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).

"A aplicação da lei tem repercussões variadas, tanto na seara administrativa, cível, criminal, e também eleitoral. Se ficar comprovada a participação intelectual, como incentivador, idealizador, como coautor, o ex-presidente Jair Bolsonaro pode, sim, ficar inelegível, não só pela condenação em um crime, mas também pela prova emprestada que todo esse inquérito virá a produzir e que pode ser utilizada em ação de investigação judicial eleitoral, que está em trâmite na Justiça Eleitoral", afirmou Ribeiro.

O ministro Alexandre de Moraes decidiu manter presas 354 pessoas envolvidas nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro. Outras 220 pessoas conseguiram a liberdade provisória, mas tendo de cumprir medidas cautelares, como recolhimento domiciliar no período noturno e nos finais de semana com uso de tornozeleira eletrônica e proibição de deixar o país, tendo de entregar os passaportes em cinco dias.

Além das pessoas que estiveram na Esplanada dos Ministérios no dia da quebradeira, as investigações avançam sobre idealizadores, incentivadores e financiadores. “Há, sem dúvida, um cerco cada vez mais fechado, está cada vez mais próximo de um final. E esse cerco envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro e Anderson Torres (ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal). O ex-presidente Jair Bolsonaro, se não vier a ser preso, tem chances de sair condenado nos inquéritos que estão em curso neste momento", destacou o advogado Antônio Ribeiro.

Extrema direita acordada e viva

A possibilidade de que Bolsonaro seja uma carta fora do baralho político nos próximos anos também já foi motivo de conversas internas de seu partido, o PL, de olho num herdeiro político do ex-presidente e nos mais de 58 milhões de votos que ele obteve nas urnas no último pleito. Para o advogado da Abradep, isso evidencia que a extrema direita continua ativa.

"A extrema direita se mantém viva independentemente do bolsonarismo. O bolsonarismo surge com o presidente Jair Messias Bolsonaro, mas vem e ganha força a partir da extrema direita que há no Brasil e que sempre existiu, e que sempre vai existir, assim como temos na Alemanha”, explica Ribeiro. "Depois de Hitler, o nazismo ainda permanece. E aqui no Basil não vai ser diferente. Vão surigr novas pessoas, novos candidatos, novos atores que vão tentar ocupar esse lugar, talvez com uma estratégia diferente, mas a extrema direita não vai deixar de existir. E caberá às instituições permanecerem sempre atentas para os riscos que o extremismo, seja de direita ou de esquerda, podem trazer à democracia", alertou o especialista.

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