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Impasse entre Estados Unidos e China bloqueia negociações de financiamento na COP27

No último dia da COP27, nesta sexta-feira (18), as negociações entre os 197 países participantes da Conferência do Clima da ONU no Egito se focam em uma solução sobre a criação, ou não, de um fundo internacional para compensar os países mais vulneráveis pelas perdas e danos que eles já sofreram devido ao aquecimento do planeta.

John Kerry, à direita, e Xie Zhenhua, enviado especial da China para o clima, se cumprimentam na COP27 da Cúpula Climática da ONU, quinta-feira, 17 de novembro de 2022, em Sharm el-Sheikh, Egito.
John Kerry, à direita, e Xie Zhenhua, enviado especial da China para o clima, se cumprimentam na COP27 da Cúpula Climática da ONU, quinta-feira, 17 de novembro de 2022, em Sharm el-Sheikh, Egito. AP - Nariman El-Mofty
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Lúcia Müzell, enviada especial a Sharm el-Sheikh

Outro aspecto importante do financiamento climático, sobre os recursos para adaptação e mitigação dos países em desenvolvimento, também não saiu do impasse, que têm Estados Unidos e China como protagonistas.

Os países ficaram até tarde da noite tentando avançar em um acordo sobre as perdas e danos, que desde o começo, é o principal ponto de discórdias na COP27. O embate se dá entre os países mais expostos à emergência climática, como as ilhas insulares, e as grandes potências desenvolvidas, lideradas pelos americanos.

A União Europeia lançou na noite de quinta-feira (17) uma proposta que conjuga a criação de um fundo, alimentado com doações destinadas aos países vulneráveis, uma reforma nos bancos multilaterais de desenvolvimento e a suspensão do reembolso da dívida dos países vulneráveis atingidos por catástrofes climáticas.

Entretanto, segundo a diplomacia brasileira que representa o pais na conferência, o G77+China – grupo de países em desenvolvimento formado por 130 nações e a China, do qual o Brasil faz parte – recusou a proposta. Conforme um diplomata afirmou à RFI, o texto da UE impõe condições que não interessam ao G77.

A proposta europeia limita o acesso aos fundos a um número muito reduzido de países vulneráveis, na visão do grupo, e obriga os emergentes a também contribuírem para o mecanismo. “É uma tentativa previsível da União Europeia de dissolver o G77 nas negociações”, disse uma fonte à RFI, sob condição de anonimato.

EUA x China

Mas o centro da negociação ocorre mesmo entre Estados Unidos e China. Um entendimento entre os dois maiores emissores de gases de efeito estufa é crucial para qualquer acordo sobre o clima, porém o diálogo entre os dois países está abalado há meses, desde que a presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, visitou a província de Taiwan. Neste contexto, as negociações climáticas acabam prejudicadas.

Os americanos querem garantias de que a China, potência emergente que hoje responde por um quarto das emissões mundiais de CO2, também contribua para o eventual fundo. Os chineses respondem que já disponibilizam recursos financeiros o suficiente, via diferentes instrumentos. 

Além disso, os EUA temem que a criação de um mecanismo específico sobre perdas e danos “oficialize a dívida” climática que as economias desenvolvidas possuem com o mundo, ao serem as maiores responsáveis históricas pelo aquecimento do planeta. Os países ricos emitem 48% dos gases de efeito estufa despejados na atmosfera, enquanto os 5% mais pobres emitem apenas 12%. E, nesta conta, os Estados Unidos despontam na frente no papel de maiores emissores históricos – portanto, os maiores causadores de todo o problema.

Os americanos também defendem que as organizações financeiras existentes, como o Banco Mundial ou o FMI – controladas, sobretudo, pelos ocidentais –, são suficientes para gerenciar a questão.

Apelos na reta final 

Na noite de quinta-feira, o presidente da COP27, o ministro egípcio Sameh Shoukry, lamentou as divergências persistentes entre os países e que “algumas discussões não reflitam o esperado reconhecimento (...) da gravidade da crise climática”. “O mundo está esperando que nós demonstremos seriedade para tratar desta questão, e enquanto uma comunidade de nações, nós devemos atender às expectativas”, clamou.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, chegou ao balneário para acelerar a última etapa de negociações e tentar evitar que a conferência termine em um fracasso. “A maneira mais eficaz para reconstruir a confiança é encontrando um ambicioso e crível acordo sobre perdas e danos e apoio financeiro para os países em desenvolvimento”, ressaltou Guterres. “O tempo para falar sobre perdas e danos acabou. Precisamos de ação”, disse.

Novo rascunho do texto final

Apesar dos apelos, nesta manhã um novo projeto de declaração final do evento foi divulgado pela agência da ONU para o Clima e o texto deixa uma lacuna sobre o aspecto das perdas e danos, indicando que as delegações ainda trabalham em busca de algum consenso.

Pela primeira vez, nesta COP, o tema da criação de um fundo específico para essa compensação entrou na agenda oficial da conferência, o que foi celebrado no início do evento, Sharm el-Sheikh, em 8 de novembro. Entretanto, até agora não há sequer uma decisão sobre o mecanismo ser ou não criado.

O documento revelado nesta manhã também exclui uma proposta da Índia para encaminhar a redução dos combustíveis fosseis, maiores fontes de emissões de gases de efeito estufa. Em plena guerra na Ucrânia, que relançou o recurso a usinas a carvão para compensar as sanções ocidentais contra a Rússia – que impactam nas exportações do pais de gás, menos poluente –, a COP27 sequer menciona a ideia dos indianos.

O recuo acontece um ano depois de os países concordaram pela primeira vez, na conferência de Glasgow, em encorajar os esforços contínuos para acelerar as medidas para a redução gradual da energia de carvão" e deixar de subsidiar "combustíveis fósseis ineficientes".

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