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Ataque de Biden contra Putin: um recado para a Europa?

É sabido que os políticos democratas dos Estados Unidos, em geral, não têm a menor simpatia por Vladimir Putin. Assim mesmo, causou espanto o tom agressivo com que o presidente Joe Biden atacou o mandatário russo, chamado-o de “assassino”.

Joe Biden vs. Putin vs. Aliados Europeus
Joe Biden vs. Putin vs. Aliados Europeus © Fotomontagem RFI/Adriana de Freitas/ AP
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Aparentemente Biden estaria apontando para uma acusação de que Putin estaria envolvido na tentativa de envenenamento do dissidente Alexei Navalny, tratado na Alemanha, hoje de volta e detido na Rússia, além da possibilidade de ser o mandatário da eliminação de outros dissidentes russos, como o ex-agente da KGB Alexander Litvinenko que se refugiara no Reino Unido, onde morreu em 2006 envenenado por polônio radioativo. 

Porém o violento ataque de Biden tinha certamente outros alvos, além de Putin, a saber, alguns de seus aliados europeus. Independentemente de quem esteja na presidência dos Estados Unidos, o governo norte-americano vê com crescente preocupação a proximidade crescente da Europa com a Rússia, e também a deste país com a China.

A proximidade de países europeus com Moscou ganhou intensidade nas últimas semanas graças aos problemas que a Europa vem enfrentando diante do recrudescimento da pandemia provocada pelo coronavírus e suas novas variantes.

Vários países do continente têm tido dificuldades para levar adiante seus programas de vacinação contra o vírus devido à falta de matéria-prima, isto é, vacinas, pois os laboratórios privados de países como o Reino Unido, os Estados Unidos e também a Alemanha vem tendo problemas para atender a demanda.

Alguns daqueles países estão se voltando para a vacina Sputnik V, fabricada na Rússia. Países da antiga órbita soviética, tradicionalmente recalcitrantes em aproximar-se da Rússia, vêm requisitando a vacina russa, como é o caso da Hungria, da Sérvia e de outros países balcânicos. Recentemente o governo italiano declarou que recorreria à Sputnik V mesmo sem o aval da Agência Europeia de Medicamentos e o governo alemão também se mostra disposto a utiliza-la, embora aguardando o pronunciamento da Agência. 

Gasoduto: fonte de preocupação

Além das vacinas e da pandemia, há outra preocupação fundamental que atormenta as autoridades Washington. Alguns dias atrás o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, advertiu as empresas que vêm trabalhando na construção do gasoduto chamado Nord Stream 2, que deve levar gás da Baía de Narva, não distante de São Petersburgo, na Rússia, até a cidade de Lubmin, no nordeste da Alemanha, através do Mar Báltico. Já existe um gasoduto que leva gás da Rússia para a Alemanha no Mar Báltico, o Nord Stream 1.

O segundo gasoduto, no mínimo, duplicaria a capacidade do fornecimento entre os países. O Nord Stream 2 foi planejado há mais de uma década, e atualmente falta apenas a construção de cerca de 150 do seu total de 1.200 km. Segundo o governo norte-americano, 18 empresas envolvidas no empreendimento já o abandonaram, temendo as sanções que, de acordo com Blinken, seriam pesadas. 

Os Estados Unidos alegam que o principal objetivo da duplicação do gasoduto no Mar Báltico é político, não econômico.  Haveria, segundo a alegação, “um plano russo para dividir a Europa e enfraquecer a segurança energética do continente”, através da crescente dependência em relação à Rússia.

Por trás do empenho de Washington em não permitir o término do segundo gasoduto há também um interesse econômico, além do político. Os Estados Unidos pretendem vender sua própria produção de gás para a Europa, o que seria um importante estímulo para sua economia.

No continente europeu, as opiniões se dividem quanto à matéria. Os críticos do projeto levantam problemas ambientais, agitando questões como a de que o gás metano, que será objeto do transporte, é tão prejudicial ao meio-ambiente como a queima de carvão, além de prolongar a dependência em relação ao uso de combustíveis fósseis. Já os defensores alegam que a Alemanha e a Europa precisam de um plano de transição até que outras fontes de energia, como a eólica, possam atender a demanda continental. 

Europa dividida

A questão é particularmente delicada na Alemanha, que está fechando suas usinas nucleares. Alegam estes defensores no país que, se de um lado a Alemanha consegue manter uma reserva permanente para suprir a demanda por três meses, a duplicação do gasoduto baratearia consideravelmente o custo da energia.

O fato é que a Europa está mesmo dividida perante a questão. Além da Alemanha, a Holanda e a Áustria já se manifestaram favoravelmente ao término da construção. Polônia, Lituânia e França se manifestaram contra. Há a preocupação de que o término da obra enfraqueceria países como a Polônia e a conturbada Ucrânia, que seriam parte de uma rota alternativa para o fornecimento do gás russo para o continente.

O Parlamento Europeu aprovou por grande maioria uma moção em favor da suspensão dos trabalhos no Mar Báltico: 581 votos pela moção e apenas 50 contrários, com 44 abstenções. Entretanto a moção não passa de um recomendação, sem caráter vinculante em relação aos países membros da União Europeia. 

Josep Borrell, o diplomata catalão-espanhol responsável pela Pasta de Relações Internacionais da Comissão Europeia, declarou que o problema do Nord Stream 2 é exclusivamente alemão. Ademais, há uma rejeição quase unânime quanto à ideia de sanções contra as empresas envolvidas no empreendimento, advertindo que promover punições econômicas a aliados não é uma política adequada de boa vizinhança.

Já a população da cidade alemã de Lubmin, ponto de chegada do novo gasoduto, vem se manifestando em grande parte em favor do projeto. Além de projetar vantagens econômicas no futuro próximo, alguns dos habitantes lembram que, além do gás, o intercâmbio pode facilitar o acesso a outros produtos como, por exemplo, a vodca russa, de grande prestígio na região para enfrentar o gélido inverno da costa do Mar Báltico.

 

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