Argentina: desafio do novo presidente Macri é conquistar desconfiados
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O que ninguém esperava há um mês aconteceu: Mauricio Macri é o novo presidente eleito. E com esse pedido de união e de apoio, Macri fez o seu discurso de vitória. O medo a uma continuidade do chamado kirchnerismo foi maior do que o medo a uma mudança. Depois de 12 anos do regime dos Kirchner, o período mais longo de governo da história democrática do país, a Argentina entra num novo ciclo político
Marcio Resende, correspondente da RFI Brasil em Buenos Aires
Mauricio Macri conseguiu derrotar o candidato da presidente Cristina Kirchner, Daniel Scioli. Mas a diferença foi muito menor do que as sondagens indicavam. Menos de três pontos de diferença, apenas 2,8 pontos. O curioso é que no primeiro turno, em 25 de outubro, Scioli superou Macri pela mesma diferença: apenas 2,9 pontos. Uma clara demonstração de como o jogo se inverteu na disputa mais acirrada da história em apenas um mês.
Essa escassa diferença revela que o país continua dividido quase ao meio entre prós e contra Kirchner.Por isso, no seu discurso de vitória, Macri ressaltou a necessidade de união de todos, mesmo daqueles que não votaram nele.
Expectativa
Ao longo dos últimos 12 anos, os Kirchner fizeram do confronto um estilo de governo e de demonstração de poder. Geraram inimigos reais ou irreais para desviar a atenção, para disciplinar o adversário ou para unir militantes.
O que vamos ver agora é um presidente com um estilo de negociação, de diálogo e de acordos. Na verdade, o desafio do Macri é sobretudo normalizar os ânimos, a política e a economia.
Os Kirchner nunca fizeram uma reunião de ministros. Governaram de forma pessoal. Vamos ver agora menos protagonismo do comandante e mais da equipe, mais poder delegado e mais reuniões de trabalho coletivo.
É preciso voltar sete anos para encontrar uma coletiva da presidente Cristina Kirchner com a imprensa. E antes disso, só quando o marido dela, Néstor Kirchner, foi candidato a presidente em 2003.
Desafios
Menos de três pontos de diferença terão implicâncias políticas. Macri deverá construir poder. Nesta primeira fase, deverá seduzir a outra metade dos argentinos que desconfiam dele. Desconfiam que ele vai governar para uma elite, que vai acabar com os planos assistencialistas, com os subsídios e que vai favorecer os mercados.
E Macri vai precisar operar com o cuidado de um cirurgião na hora de tomar medidas econômicas para não perder o apoio da outra metade que apostou nele. Por isso, no discurso de vitória, ele pede não só união e o apoio dos que não votaram nele, mas também que não o abandonem.
No Parlamento, Macri vai precisar construir uma maioria que não tem. Vai precisar formar alianças.Terá de negociar consensos e acordos com a oposição. Essa oposição estará em disputa: Sergio Massa, o terceiro colocado, e Cristina Kirchner devem brigar por liderar a oposição.
Mas Macri tem uma boa vantagem. O partido dele vai governar o Distrito Federal, a província de Buenos Aires e o Estado. Macri terá os três principais governos, algo que nem o kirchnerismo conseguiu em 12 anos.
Economia
O desafio econômico é o mais complicado e urgente. O país tem graves problemas de financiamento. Acabaram-se os dólares. O Banco Central está quebrado. Será necessário negociar com os fundos especulativos para poder ter acesso ao crédito e gerar a confiança suficiente para atrair investimentos.
Macri prometeu acabar com as fortes barreiras cambiais no dia seguinte à sua posse em 10 de dezembro. Até lá, aliás, a presidente Cristina Kirchner poderá continuar a tomar medidas que compliquem ainda mais o próximo governo.
Macri já insinuou que vai procurar um pacto de governabilidade com empresários, sindicatos, banqueiros e legisladores.
Brasil
Para o presidente eleito, a relação com o Brasil será a mais importante. Depois que assumir a Presidência, Macri vai fazer a sua primeira viagem internacional ao Brasil para se reunir com a presidente Dilma Rousseff. Macri vai propor a Dilma um jogo franco de fortalecimento da relação da Argentina com o Brasil como ponto de partida para encarar a negociação do Mercosul com a União Europeia por um acordo de livre comércio e também uma convergência do Mercosul com a chamada Aliança do Pacífico, bloco formado por Peru, Colômbia, Chile e México.
Macri também promete acabar com as barreiras que hoje emperram o comércio bilateral com o Brasil.Marcio Resende, correspondente da RFI Brasil em Buenos Aires
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