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Reforma política na Câmara atende a interesses de deputados, não de brasileiros

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A Câmara dos Deputados pretende encerrar até o fim da semana a votação da proposta de reforma política, que depois seguirá para análise no Senado. Até o momento, no entanto, o texto elaborado por uma comissão especial de parlamentares pouco mexe na principal demanda dos brasileiros para combater a corrupção: o financiamento das campanhas eleitorais.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, durante sessão no plenário.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, durante sessão no plenário. Gustavo Lima / Câmara dos Deputados
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O pedido pela reforma política esteve nas ruas nas manifestações de junho de 2013. O tema foi um dos focos das eleições presidenciais do ano passado – tanto Dilma Rousseff quanto Aécio Neves prometeram que essa seria uma prioridade de governo. Porém, o texto que circula na Câmara não reflete as mudanças apontadas por analistas como necessárias para melhorar o sistema político-partidário brasileiro, como destaca o cientista político Manoel Leonardo Santos, professor UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

“Com a reforma política, o eleitor, de um modo geral, quer uma diminuição do problema da corrupção na política e uma melhor qualidade da representação. Dos projetos que estão em apreciação agora e serão votados até o fim da semana, me parece que um ponto central não vai mudar significativamente: o financiamento de campanha. É provável que tenha alguns ajustes, em termos de limitação de gastos, com a fixação de um teto dos gastos de campanha. Mas a questão central não foi discutida”, afirma. “Acabou ficando do jeito que estava, com a possibilidade de doação, por empresas, no processo político. É isso que a sociedade vê como a principal fonte de corrupção ou de troca de favores entre os setores econômicos e os políticos.”

Até o momento, os deputados aprovaram o fim da reeleição para cargos executivos, a duração de mandato de cinco anos e a redução pela metade do tempo de campanha eleitoral. Também estabeleceram um teto de R$ 20 milhões para as doações empresariais para os partidos, com a proibição de entrega de dinheiro diretamente para os candidatos. O cientista político Carlos Alberto de Melo, professor do Insper, acha que o pacote é superficial.

“Esses deputados do Brasil são muito espertos. Na verdade, eles aproveitaram a crítica ao sistema político – que é real – para fazer uma reforma eleitoral de acordo com as suas conveniências”, dispara. “Não melhoram a representação, não resolvem os problemas, mas, para eles, resolve uma série de questões. E ainda tentam passar a história como se tivessem feito a reforma política – sobretudo o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.”

Conflito de interesses

Santos observa que existem políticos interessados em promover verdadeiras mudanças no sistema brasileiro – mas os parlamentares penam a chegar a um acordo. Desta forma, o texto acaba esvaziado.

“Eu não enxergo, no debate entre os partidos e entre os políticos, um bom debate sobre como a reforma poderia melhorar o sistema político como um todo. Quando você analisa as posições dos partidos, o que você vai encontrar é que eles estão formulando propostas para melhorar a sua situação e sobreviver no poder”, analisa.

Uma alternativa para contornar esse conflito de interesses poderia ser a implantação de uma constituinte exclusiva para a reforma política, que definiria a pauta sem ter interesses diretos envolvidos nos resultados, na opinião de Melo.

“Os constituintes podem ter o compromisso moral de se reunir apenas para discutir a reforma política, e com um detalhe: não podem ser candidatos durante um bom tempo.Ou seja, o constituinte definiria regras que não seriam para ele mesmo”, avalia Melo. “O grande problema hoje é que deputados e senadores definem as regras de um jogo que eles mesmos vão jogar.”

O cientista político do Insper ressalta que pontos mais profundos da política brasileira, como a distribuição de cargos em troca de apoio, sequer passaram perto do texto debatido na Câmara. “Se tocasse nessa questão, tTalvez você fizesse de fato uma reforma política que obrigasse governos e partidos a coalizões programáticas, e não fisiológicas. Isso, sim, está absolutamente distante do nosso horizonte.”

O Senado já avisou que só vai começar a debater o assunto após o retorno do recesso parlamentar, que começa na semana que vem.
 

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