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Sanções prejudicam UE e Rússia e têm pouca influência sobre crise ucraniana

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Neste fim de semana, uma nova rodada de sanções de ocidentais contra a Rússia pode ser desencadeada, em represália à ingerência de Moscou na crise ucraniana. Mas analistas observam que, além de as medidas prejudicarem tanto europeus quanto russos, as sanções não são suficientes para fazer o presidente Vladimir Putin mudar de posição.

Suspensão do fornecimento para a Rússia do primeiro navio navio porta-helicópteros Mistral.
Suspensão do fornecimento para a Rússia do primeiro navio navio porta-helicópteros Mistral. REUTERS/Stephane Mahe
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O último capítulo foi a suspensão, pela França, dos contratos de venda de dois navios de guerra Mistral para a Rússia – a entrega do primeiro estava prevista para outubro. Pressionado há meses pelos parceiros ocidentais, o governo francês decidiu que as condições para a entrega de equipamentos bélicos para a Rússia não estão reunidas. O congelamento do negócio, avaliado em € 1,2 bilhões (R$ 3,4 bilhões), foi um balde de água fria nas centenas funcionários que participam da construção dos porta-helicópteros.

“É uma surpresa, embora a gente soubesse que a situação estava cada vez mais insustentável, em relação ao que acontece na Ucrânia. Mas, como algumas semanas atrás, o presidente disse que entregaria o primeiro navio, para a gente este anúncio foi um choque”, afirma Christophe Morel, delegado sindical dos funcionários.

O pesquisador Arnaud Dubien, diretor do Observatório Franco-Russo, ressalta que, por enquanto, nada leva a crer que os contratos serão cancelados, apesar da ameaça do presidente François Hollande. Dubien avalia que a anulação do negócio custaria muito caro para a França, ainda mais em época de crise. O país teria de reembolsar os 80% do pagamento já feitos por Moscou.

“Eu acho que a França não podia ficar mais tempo em silêncio, embora seja isso que ela desejasse fazer. Ela foi obrigada a ter alguma reação sobre esse assunto. No entanto, ela não renunciou à entrega dos navios: apenas disse que hoje não vai ser possível entregá-los”, observa. “Mas ninguém sabe se a decisão será mantida no início de outubro ou de novembro. Eu acho que a França não pode deixar de entregá-los - e ela vai entregá-los.”

Já a Rússia gostaria de modernizar a frota naval, mas os dois navios estão longe de serem essenciais para o país, na avaliação do especialista, que também é pesquisador do Instituto Francês de Relações Internacionais (Ifri).

“Sob um ponto de vista operacional, a Rússia não precisa muito desses navios Mistral. É por isso que a França teria mais a perder do que a Rússia, tanto em termos financeiros quanto, principalmente, em reputação”, destaca. “A Marinha de guerra russa vai sobreviver sem os Mistral.”

Prejuízos para todos

As sanções adotadas até agora tanto pelos ocidentais quanto pelos russos acabaram prejudicando os dois lados, com a diminuição do fluxo comercial. A Rússia adotou um embargo a produtos agrícolas da União Europeia, que acertou em cheio setores específicos na Polônia, Grécia e na própria França. A situação levou os ministros da Agricultura dos países do bloco a se reunirem nesta sexta-feira (5) para articular uma compensação das perdas dos agricultores e atenuar a queda dos preços.

“As medidas de reação tomadas para mostrar que haverá prejuízos sempre são cuidadosamente estudadas, para poderem atingir grupos específicos de pressão e organizações poderosas, que são capazes de se fazerem ouvidas e respeitadas, como é o caso dos agricultores”, ressalta o pesquisador Julien Vercueil, professor do Instituto Nacional de Línguas e Civilizações Orientais (Inalco). “Agora, os europeus têm de se coordenar para consertar esses prejuízos. A política agrícola europeia existe para isso, de certa forma.”

Vercueil tem certeza de que, se os ocidentais aumentarem as sanções, a resposta russa não vai tardar, em igual intensidade. O país poderia ampliar os setores agrícolas sob embargo ou restringir o fornecimento de energia para a União Europeia, às vésperas do inverno. Arnaud Dubien ainda levanta outras hipóteses. “Tem alguns cenários extremos, como a Rússia decidir suspender a entrega de titânio para a Airbus e a Boeing, parar de alimentar a estação espacial internacional, começar a exigir autorização de passagem sobre o espaço aéreo da Sibéria, entre tantas outras opções. Mas, ao mesmo tempo, a Rússia não tem nada a ganhar fazendo isso”, comenta.

Ucrânia segue no impasse

Até o momento, as sanções ocidentais não fizeram o presidente Vladimir Putin mudar em nada a postura em relação à crise ucraniana – pelo contrário, a participação russa no conflito apenas se acentuou nos últimos meses. Os especialistas garantem que não serão as medidas de represália que vão levar ao fim do conflito – mas como nenhum dos lados deseja uma “guerra total” na Europa, as sanções são a única alternativa que resta, apesar da ineficiência.

Julien Vercueil destaca que, embora o discurso de Putin seja de indiferença, as medidas têm consequências cada vez mais graves na economia russa. “A realidade do choque das sanções na Rússia é bem maior do que aquilo que se lê na imprensa ou que circula na Rússia, de uma maneira geral. A economia russa já estava com queda de crescimento, ligada não somente às sanções, como à elevação brutal do nível de incertezas desde março, depois da anexação da Crimeia pela Rússia”, sublinha. “Esses dois elementos afetaram os investimentos, o comércio e provocaram um freio brutal da economia.”

Os especialistas lembram que, na Rússia, o governo tem usado justamente as sanções internacionais para explicar o desempenho fraco da economia. O país só deve crescer 0,5% neste ano.

 

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