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França

Campanha quer sensibilizar opinião pública francesa contra incesto

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Mais de dois milhões de adultos na França foram vítimas de incesto e abuso sexual durante a infância, segundo uma pesquisa da Associação Internacional das Vítimas de Incesto (AIVI). Um crime que, apesar da sua gravidade, ainda não integra o Código Penal francês. Para sensibilizar as autoridades e a população, e estimular as pessoas a obter ajuda, uma campanha está sendo veiculada desde o dia 28 de janeiro na TV francesa.

Captura vídeo do clip da campanha contra o incesto. "Uma criança nunca consente".
Captura vídeo do clip da campanha contra o incesto. "Uma criança nunca consente". http://www.cfcv.asso.fr/
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O clipe é uma iniciativa da organização Coletivo Feminista contra o Estupro, e deve ficar no ar no mínimo 7 dias nos principais canais franceses. A mudança da legislação sobre o incesto é uma batalha que vem sendo travada há anos pelas associações de vítimas na França.

Na sexta-feira, a ministra pelos Direitos das Mulheres, Najat Vallaud-Belkacem, anunciou seu apoio a um novo projeto de lei, que também é defendido por vários grupos na Assembleia Nacional francesa.

Segundo Isabelle Aubry, presidente da associação, hoje um dos principais problemas em relação à questão é a falta de uma legislação específica para esse tipo de crime, que se enquadra na lei como estupro. Mas na maioria das vezes, como a denúncia ocorre tarde demais, o incesto ou abuso sexual é julgado como um simples delito, com penas que dificilmente chegam a dez anos de prisão.

Decisões na Justiça revoltam vítimas

Essa é uma das principais reivindicações das associações de ajuda às vítimas, explica Isabelle. "Queremos que o incesto seja julgado como um crime e não como um delito da mesma gravidade que um roubo de carro ou de um celular." Há um outro aspecto da legislação francesa que revolta os adultos que sofreram abuso na infância : o fato do ‘consentimento’ ser um fator determinante.

"Temos um membro da Associação que foi levado a júri popular, que sofreu abuso aos 11 anos. Seu tio reconheceu os fatos na frente dos jurados, pediu desculpas para a vítima, mas foi inocentado. Isso porque o menino não conseguiu dizer "não." A Justiça entendeu que ele consentiu e não foi um estupro."

Isabelle fala com conhecimento de causa. Ela mesma viveu uma situação parecida, o que a levou a criar a associação nos anos 2000 para ajudar pessoas que vivenciaram o mesmo problema.

"Quando meu pai foi julgado, o juiz de instrução fez seu trabalho, e perguntou se eu havia dado o consentimento para o ato sexual. Respondi que não entendia a pergunta, e ele insistiu em saber se eu disse não. Respondi que obviamente não podia dizer não porque era meu pai!" O pai de Isabelle foi condenado a apenas seis anos de prisão, porque a Justiça francesa considerou que a relação sexual foi consentida.

Em média, as vítimas demoram 16 anos para denunciar o abuso, cometido em 80% das vezes por alguém da família, principalmente o pai ou o irmão, e 20% das vezes por um adulto de fora do círculo de amizades dos pais e amigos.

"A criança tem medo de falar. Além de ter sido ameaçada, teme destruir a família com essa revelação, preferindo se calar, e guardar isso para si mesma. Também existe o fenômeno da negação, que protege a vítima do traumatismo ao qual ela foi submetida."

Em geral, explica Isabelle, a tendência é que o trauma reapareça anos mais tarde, em momentos decisivos da vida, como um casamento por exemplo. Só então os adultos se sentem prontos para falar sobre o assunto, e as emoções, reprimidas durante anos, vêm à tona.

Quase 5% das crianças francesas são vítimas de incesto

A psiquiatra Emmanuelle Piet, do Coletivo Feminista contra o Estupro, conta que o incesto é um drama que atinge todas as classes sociais e regiões na França, independentemente da condição social. Por isso ela incita as pessoas que passaram por este tipo de situação a buscarem ajuda.

"O Conselho que damos para as vítimas é para que elas não se fechem, não fiquem sozinhas, e tentem encontrar alguém que possam ajudá-las no procedimento jurídico. Em geral, as vítimas de incesto são pessoas muito solitárias. E essa é a importância de uma associação como a nossa: ajudá-las a quebrar o silêncio."
 

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