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França

Sociólogo fala sobre versão francesa de rolezinhos

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Os "rolezinhos", novo fenômeno social no Brasil, relançam o debate no país sobre a inserção da periferia, e dividem opiniões. Veja a análise do sociólogo francês François Bonnet, pesquisador do CNRS, o Centro Nacional de Pesquisa Científica, que compara o fenônemo à situação na França.

Imagens da tentativa de "rolezinho" no Leblon foram reproduzidas em vários jornais pelo mundo.
Imagens da tentativa de "rolezinho" no Leblon foram reproduzidas em vários jornais pelo mundo. REUTERS/Ricardo Moraes
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O temor da polícia, comerciantes e clientes dos shopping centers é de que os "rolezinhos", que tiveram início em dezembro, sejam um pretexto para a prática de furtos e outros delitos.

Mas uma boa parte da sociedade defende que os encontros evidenciam as desigualdades sociais e a discriminação em relação à população da periferia, que organiza os encontros nas redes sociais.

O mal-estar entre classes, entretanto, não é uma prerrogativa brasileira ou dos países em desenvolvimento. Na França, os jovens do subúrbio também não são bem-vindos em certos locais, frequentados prioritariamente pelas classes mais altas.

O sociólogo francês François Bonnet, pesquisador do CNRS, o Centro Nacional de Pesquisa Científica, é um especialista na análise da presença da população marginalizada em centros comerciais.

O pesquisador explica que, na França, já houve situações parecidas, envolvendo jovens franceses negros ou muçulmanos de origem do norte da África, vítimas frequentes da discriminação no país. Mas uma das diferenças em relação ao Brasil, por exemplo, é que o encontro não é organizado pela redes sociais.

Tumulto em shopping de Lyon acaba em quebra-quebra

Ele cita, por exemplo, o tumulto ocorrido em Lyon em 1998, no último dia do Ramadã, o jejum praticado anualmente pelos muçulmanos. Cerca de 400 jovens se reuniram no maior centro comercial da cidade, desencadeando confrontos com a polícia, resultando em oito feridos. As cenas de vandalismo ainda permanecem na memória dos franceses, comenta o sociológo.

"Foi um tumulto que tinha uma relação com a política de segurança deste centro comercial, que era um pouco agressiva, considerada racista pelos adolescentes. Digo isso mas é uma interpretação dos fatos que temos 15 anos depois. Mas não passa de uma interpretação", ressalta.

Como os tumultos dos jovens da periferia são analisados na França? Para François Bonnet, existem vários aspectos que devem ser levados em conta. Segundo ele, na França, a 'baderna' promovida pelos jovens pode até importunar clientes e comerciantes - em geral, como no Brasil, eles invadem os corredores, mexem com as meninas e até praticam pequenos furtos.

Mas a percepção desse 'incômodo' é diferente dependendo do público-alvo das lojas do centro comercial em questão, explica o pesquisador. "Todas as lojas não têm a mesma opinião em relação a seus clientes. Para as marcas de roupa de luxo, por exemplo, é claro que esse jovens não são uma prioridade. Mas os Fast Foods, Mc Donalds, Lan Houses, etc, vivem do consumo desses jovens", diz.

Jovens pobres na França não deixam de ser clientes em potencial

De acordo com o sociólogo, é preciso também levar em conta as diferenças econômicas entre a França e o Brasil, um país onde a desigualdade é mais presente. Diferentemente da França, onde mesmo as classes mais populares têm um certo poder de compra, muitos dos jovens que participam do 'rolezinho' não podem gastar nada nos shoppings centers.

No caso brasileiro, o fato desses jovens não serem clientes em potencial suscita questionamentos, e torna tênue a fronteira entre tumulto e delinquência. "Não é só racismo. É um tipo de discriminação que combina, ao mesmo tempo, uma dimensão racial, de classe social e localização urbana. Esses jovens são considerados um problema porque vêm das favelas ou subúrbios, pobres e negros. "

Questão racial é inerente à sociedade francesa

François Bonnet lembra que na França a questão racial também é problemática e inerente à sociedade.
"Na França, claramente, a descendência muçulmana do norte da África, ou africana, é um ponto negativo para um grande número de pessoas. Morar na periferia também é um ponto negativo. Mas a desigualdade é menor em relação ao Brasil”, comenta.

Para o sociólogo, esse aspecto também diminui a diferença entre clientes e delinquentes. Além, claro, do maior número de espaços públicos dedicados ao lazer na França. Com isso, os jovens têm outras opções além do shopping center, como é o caso no Brasil.

Ele também explica que os tumultos no Ano Novo se diferem do rolezinho porque não existe “a dimensão festiva” e a conotação política. "O vandalismo do Ano Novo ou do 14 de julho não é uma maneira alternativa de festejar essas datas, mas uma maneira de estragar a festa."
 

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