França considera novo chanceler alemão um aliado "sólido e leal", mas imprensa vê nuvens no horizonte
O social-democrata Olaf Scholz, 63 anos, assume o poder por quatro anos nesta quarta-feira (8) na Alemanha, um momento marcante para a França, principal aliada de Berlim na União Europeia. Ante o novo chanceler, nada carismático e de jeito austero, a ponto de ter sido apelidado de "autômato" pela imprensa alemã, os jornais franceses tentam decifrar que tipo de aliado Paris terá em Berlim.
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Ex-ministro das Finanças de Angela Merkel e ex-vice-chanceler, Scholz é um aliado "sólido e leal", diz o ministro francês da Economia, Bruno Le Maire, nas páginas do jornal Le Parisien. Ele não fala uma palavra em francês, mas compreende a língua de Molière e Victor Hugo, e é apontado como um homem de temperamento calmo, estável e detalhista.
Segundo o diplomata francês Michel Barnier, negociador do Brexit - que teve a ocasião de trabalhar com Scholz nos últimos quatro anos - as conversas com ele podem ser longas e difíceis, mas, uma vez concluído um acordo, os termos serão respeitados.
O jornal Libération recorda que Scholz, educado em Hamburgo (norte), onde chegou a ser prefeito da cidade e construiu sua carreira política, é visto como "um narcisista, que só pensa em si mesmo e gosta de trabalhar sozinho". A alfinetada vem de um adversário, Norbert Hackbusch, porta-voz do partido de extrema esquerda Die Linke, ouvido pelo Libération. A reportagem destaca que o primeiro livro sobre o social-democrata está sendo publicado nesta semana, agora que ele vai dirigir a maior economia da União Europeia.
O diário progressista dedica algumas linhas aos hábitos do novo chanceler. "Apesar da calvície, Scholz vai uma vez por semana ao barbeiro. (...) Fez uma dieta e perdeu alguns quilos incentivado pela mulher, Britta Ernst, ministra da Educação da região de Brandemburgo. (...) Como Angela Merkel, ele gosta de fazer caminhadas e permanece impassível durante negociações que podem invadir a madrugada. O máximo de irritação que demonstrou num debate foi ficar com as orelhas vermelhas."
O único assunto que pode arrancar de Scholz uma emoção é sua mulher, diz o jornalista alemão Lars Haider, também ouvido pela reportagem do Libération.
Possíveis pontos de atrito
O jornal Le Figaro aponta os desafios que o novo chanceler tem pela frente. Em primeiro lugar, liderar uma coalizão de três partidos, que reúne os social-democratas, verdes e liberais. "O acordo de coalizão prevê uma rápida eliminação da produção de carvão até 2030, levando o país a produzir 80% da energia a partir de fontes renováveis. Mas não está claro de que maneira a Alemanha irá alcançar este objetivo, sublinha o Le Figaro.
Ao propor uma futura liberalização do comércio da maconha e redução da maioridade eleitoral para 16 anos, o contrato da aliança destacou os pontos de convergência entre os três partidos no poder, ocultando as divergências econômicas, avalia o diário conservador.
A nova coalizão afirma sua determinação em manter a Alemanha entre as primeiras potências econômicas mundiais, por meio do investimento na modernização da indústria e na abertura para o exterior, o que bate de frente com o protecionismo francês, agora atrelado à ecologia. A França continua apostando na produção de energia nuclear, enquanto essa indústria segue banida na Alemanha. Na área de defesa, Berlim continua oferecendo apenas uma "participação" dentro da OTAN, a aliança militar ocidental.
Em relação à política de imigração, Paris e Berlim têm visões opostas. A Alemanha considera os imigrantes como um aporte indispensável para reverter a queda de demografia e aumentar a população ativa, autorizando a naturalização após cinco anos de estadia no país. A ameaça terrorista vem mais do inimigo interno, a extrema direita, do que do jihadismo.
Berlim também defende um diálogo construtivo com Moscou, mas que encontra dificuldades para se concretizar devido à dependência do gás russo, aponta Le Figaro. Enfim, a Turquia, do ultraconservador e autoritário Erdogan, é vista mais como parceira do que fonte de preocupação.
Já uma parceria com a França na região do Indo-Pacífico sequer foi alentada. Na análise do Le Figaro, "há nuvens no céu" entre Paris e Berlim.
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