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Como a Escócia está vencendo a insegurança alimentar ao combater o desperdício

A insegurança alimentar na Escócia, como no resto do Reino Unido, é um problema que tem crescido continuamente na última década, após a crise econômica e financeira de 2008, e as políticas de austeridade que se seguiram. A pandemia do coronavírus não ajudou, com o aumento do desemprego e a perda de renda de muitos trabalhadores escoceses. No terreno, as associações estão se organizando para lidar com a emergência. Mas a falta de acesso a alimentos é uma questão complexa que não será resolvida apenas pelos bancos de alimentos.

Funcionários de empresa escocesa lutam contra o desperdício e produzem mais de 4.000 refeições por dia.
Funcionários de empresa escocesa lutam contra o desperdício e produzem mais de 4.000 refeições por dia. © Reprodução Twitter / @EmptyKitchens
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Assa Samaké-Roman, correspondente da RFI na Escócia

Quando Lewis Maclachlan lançou sua associação Empty Kitchens, Full Hearts (Cozinhas Vazias, Corações Repletos, em tradução livre) para ajudar as pessoas sem acesso a alimentos em abril de 2020, em Edimburgo, ele não achava que haveria tantos pedidos.

O chef escocês, que hoje acessa o subsídio do desemprego parcial, disponibilizado durante a pandemia, ficou surpreso ao ver o nível de desperdício de alimentos no início do confinamento. “Muita gente ia ao supermercado e comprava muita comida em pânico, só para jogar fora um monte, enquanto naquela época os vizinhos não podiam fazer suas compras, também porque não faziam. nas prateleiras, ou porque não tinham meios ”.

Em Edimburgo, uma das cidades mais ricas do Reino Unido, a pobreza está longe de acabar. Somando-se todas as pessoas que sofreram queda de renda devido ao desemprego total ou parcial, muitas pessoas na capital escocesa estão ameaçadas pelo espectro da fome.

Lewis Maclachlan teve então a ideia de reunir colegas que trabalhavam nos bares e restaurantes da cidade, todos fechados na primavera, para coletar produtos frescos que seriam jogados fora para fazer refeições saudáveis, nutritivas e deliciosas.

Mais de 1.340 pacotes com 4.020 refeições completas por dia, incluindo café da manhã, almoço, jantar e chá da tarde, são distribuídos diariamente por dezenas de voluntários a beneficiários regulares, sem quelquer tipo de estigma social. Basta ligar e perguntar. “Isso dá aos nossos clientes um nível de segurança, uma paz de espírito, sabendo que aconteça o que acontecer, eles terão o que comer amanhã”, disse o fundador da associação.

Mercearias solidárias abertas a todos

Em Glasgow, a maior cidade da Escócia, a questão da insegurança alimentar é ainda mais aguda. Alguns bairros, mal atendidos pelo transporte público, não têm supermercados nas proximidades e contam apenas com minimercados, que não podem atender a todos.

Uma alternativa começou a surgir: os supermercados solidários, nos quais todos podem fazer compras durante a semana, independentemente da renda. O princípio: cada cliente paga uma taxa de adesão de £ 2,50 (R$ 18,44) e em troca recebe o equivalente a £ 10 a £ 15 (R$ 71 a R$ 110) em compras, fornecidas pela associação FareShare, que luta contra o desperdício de alimentos.

Atualmente são seis unidades em Glasgow e outras partes da Escócia estão interessadas neste modelo desenvolvido pela Scottish Pantry Network, liderada por Mandy Morgan, que também é vereadora da cidade.

“Queremos que este serviço seja o mais digno possível e queremos ser mais do que um serviço de alimentação: oferecemos também aconselhamento financeiro, assistência à saúde mental. Os supermercados também são locais de reintegração: um gerente é contratado, e os voluntários que ali trabalham recebem treinamento e qualificação que lhes permite entrar no mercado de trabalho. Esta é uma ajuda muito positiva para a comunidade”, diz.

Um problema transversal

Todas essas iniciativas atendem a uma necessidade urgente. Mas, infelizmente, eles não resolvem o problema como um todo, de acordo com Irina Martin, da associação Nourish Scotland, que está fazendo campanha para que o direito à alimentação seja consagrado pela lei escocesa.

“O direito à alimentação é mais do que o direito de não ter fome: é o direito de celebrar a vida, a sua cultura, a sua religião e o prazer de comer, a partilhar uma refeição com os seus familiares”, defende.

A organização acredita que a questão da fome na Escócia aborda uma infinidade de tópicos, que ainda são tratados separadamente, mas juntos podem-se criar cadeias de abastecimento de alimentos mais sustentáveis.

“Em todo caso, temos que deixar de pensar na comida como um ato de caridade. É um direito básico ”, argumenta Irina Martin. “Todos devem poder escolher uma alimentação adequada, condizente com seu próprio ecossistema, sem depender da generosidade de quem pode pagar”, conclui.

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