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Viena se insere na onda de atentados islâmicos que atinge a Europa, diz ex-juiz antiterrorista

O ex-juiz antiterrorista e especialista em segurança internacional Jean-Louis Bruguière disse, em entrevista à RFI, que “estamos claramente diante de uma onda de atentados islamitas”, provenientes, ao que parece, de uma competição entre grupos terroristas, como o Estado Islâmico (EI) e a Al Qaeda. Segundo ele, o ataque a fuzil, que deixou cinco mortos no centro de Viena, na noite de segunda-feira (2), faz parte desta onda e outros países devem ser atingidos. “A Europa está sendo atacada por seus valores, nossa democracia está sendo atacada.”

A polícia armada controla uma rua perto da ópera no centro de Viena em 2 de novembro de 2020, após um tiroteio perto de uma sinagoga.
A polícia armada controla uma rua perto da ópera no centro de Viena em 2 de novembro de 2020, após um tiroteio perto de uma sinagoga. AFP - JOE KLAMAR
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“Não é apenas na França. A gente pensava que tinha a ver com as caricaturas de Maomé, com o processo do Charlie Hebdo, mas a gente se dá conta de que se trata de uma onda de atentados que respondem a palavras de ordem do grupo Estado Islâmico sobre a renovação da ação na Europa, mas também no Sahel e na África do Oeste”, diz o especialista. “Temos de estar extremamente vigilantes”, completa.

Segundo o ex-juiz, “existem sucursais do grupo Estado Islâmico que são bastante ativas, sobretudo após a derrota da (organização) central, na Síria e no Iraque”. E, com isso, continua Bruguière, “temos esta ação renovada, que vem em correlação com a epidemia de Covid. Eu observo que, depois de fevereiro, março, o EI, em sua comunicação, incita seus simpatizantes e jihadistas a continuarem suas ações ‘com esta graça de Deus que é a epidemia de Covid-19’”.

Em entrevista à RFI, o especialista em terrorismo e segurança internacional diz que existe uma competição entre as organizações islâmicas para ver quem comete mais atentados. No início da noite desta terça-feira (3), o grupo Estado Islâmico reivindicou o ataque em Viena. 

Para o ex-juiz, o ataque em Viena não aconteceu devido ao apoio da Áustria ao governo francês diante dos recentes atentados na França. “Este ataque de Viena é parte de uma sequência muito mais profunda. É evidente que há elementos oportunistas nos ataques, como caricaturas de Maomé, que eles usam para ‘justificar ou ‘amplificar’ as ações. Mas o que o EI busca é aterrorizar a população e também demonstrar, na sua confrontação com outras organizações terroristas, sua liderança e capacidade de atrair novos militantes, novos soldados do jihad, por meio de processos de radicalização que nós conhecemos bem aqui na França”.

Perfil do atirador

O atirador responsável pelo ataque em Viena, que matou quatro civis e deixou 17 feridos na noite de segunda-feira (2), era um apoiador do grupo do Estado Islâmico que, segundo o governo austríaco, "enganou" os esforços oficiais de desradicalização.

Kujtim Fejzulai, de 20 anos, foi morto a tiros pela polícia e estava armado com uma Kalashnikov encurtada, uma pistola, um facão e um cinto explosivo falso. De acordo com o ministro austríaco do Interior, Karl Nehammer, ele tinha dupla nacionalidade macedônio-austríaca e já havia sido condenado no ano passado por tentar viajar para a Síria e tentar ingressar na organização do Estado Islâmico.

Após essa condenação, Fejzulai, cujo nome sugere que seja de origem albanesa, foi condenado a 22 meses de prisão, mas foi colocado em liberdade condicional em dezembro, após cumprir dois terços da pena.

"Ele conseguiu enganar o programa de desradicalização do sistema de justiça, enganar as pessoas que trabalham nele, e obter uma libertação antecipada por meio disso", explicou Nehammer, sugerindo que o agressor havia feito esforços especiais para driblar os oficiais e conseguir a liberdade condicional. “Portanto, não houve sinais de alerta de sua radicalização”, acrescentou.

Após o ataque de segunda-feira, a casa de Fejzulai foi invadida e as evidências de sua radicalização ficaram evidentes. “Ficou claro que o agressor, apesar de todos os sinais externos de integração à sociedade, fez exatamente o contrário”, disse o ministro.

Em uma postagem no Facebook, ele posou com a Kalashnikov e o facão que usaria no ataque junto com uma legenda dizendo que estava "servindo ao sultanato" e outras mensagens típicas do grupo EI, disse Nehammer.

Um comunicado do Ministério do Interior da Macedônia do Norte disse que ele nasceu em Moedling, uma cidade ao sul de Viena.

Houve uma tentativa anterior por parte das autoridades de Viena de privar Fejzulai de sua cidadania austríaca, mas não teve sucesso porque "não havia evidências suficientes sobre suas atividades", disse Nehammer.

14 pessoas foram detidas

Dezoito buscas ocorreram em endereços ligados a ele, com 14 pessoas detidas.

De acordo com a polícia da Macedônia, um país sem litoral nos Balcãs Ocidentais, cerca de 150 cidadãos viajaram para lutar ao lado de jihadistas no Iraque e na Síria, principalmente entre 2012 e 2016. A maioria vem da minoria muçulmana de etnia albanesa da Macedônia do Norte, que compõe cerca de um quarto da população de 2,1 milhões.

Cerca de metade já retornou, enquanto muitos outros com ligações com o grupo do Estado Islâmico estão desde então detidos em prisões na Macedônia do Norte ou em outros países.

O Ministério do Interior da Macedônia disse que foi solicitado para fornecer informações sobre três pessoas com cidadania austríaca e macedônia, incluindo Fejzulai, e afirmou estar cooperando com a Áustria “em todos os elementos ligados a este caso".

Europa no alvo

O que estas organizações buscam é abater o conjunto do nosso sistema, de nossos valores, para impor os deles, como fizeram nas áreas que eles conquistaram na Síria e no Iraque”, diz Bruguière sobre a Europa.

A Grã-Bretanha elevou nesta terça-feira o nível de ameaça de terrorismo do país de "substancial" para "grave", após o tiroteio em Viena e vários ataques em toda a França.

"Grave" - o segundo mais alto dos cinco níveis - significa que um ataque é "altamente provável", disse o serviço de inteligência britânico MI5, que anunciou a mudança em seu site.

Heróis de Viena

No meio do terror que se instaurou nas ruas da capital austríaca na noite de segunda-feira, durante os ataques, dois vienenses, um de origem turca e um palestino, se tornaram “heróis de Viena”, como vários meios de comunicação estão chamando os jovens.

Praticantes de artes marciais, os rapazes arriscaram suas vidas para ajudar uma mulher e um policial ferido. "Queríamos beber o último café antes do toque de recolher e acabamos no meio da batalha", disse Mikail Özen, descrevendo a situação. 

De acordo com suas próprias declarações, os dois jovens, Özen e Recep Gültekin, ouviram tiros e viram transeuntes sangrando na Schwedenplatz, no centro de Viena, e correram para ajudar. Um residente local gravou as cenas dramáticas de seu apartamento.

"Nós, muçulmanos turcos, desprezamos a violência e o terror. Pertencemos a Viena, pertencemos à Áustria", disse Özen em entrevista à TV austríaca ORF.

(Com informações da AFP)

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