Fashion Week de Paris começa com desfile Cardin em espaço criado por Niemeyer e briga de herdeiros
Começou nesta segunda-feira (25) a temporada parisiense de desfiles com as coleções primavera-verão 2024. O primeiro dia da maratona fashion na capital da moda é marcado pelo desfile da Maison Pierre Cardin, que se apresenta na sede do Partido Comunista Francês (PCF), um prédio concebido pelo arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer. A marca é dirigida por um dos sobrinhos do costureiro, acusado de fraude pelos demais familiares do estilista morto em 2020.
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Silvano Mendes, de Paris
A Fashion Week é sempre um momento de descoberta de novos talentos, como a belga Marie Adam-Leenaerdt, o holandês Duran Lantink ou o australiano Christopher Esber, que fazem seus primeiros passos esta semana na programação parisiense de moda feminina. Mesmo se a temporada de desfiles acontece no final do circuito internacional, após Nova York, Londres e Milão, Paris continua atraindo jornalistas, compradores e influenciadores do mundo todo para sentir o pulso da moda na terra da alta-costura.
Cada vez mais, a Fashion Week também é marcada por polêmicas, rumores e escândalos. Um dos assuntos mais comentados nesta edição é o desfile da Maison Pierre Cardin, que tenta, em meio a uma briga de herdeiros, manter o interesse do público após a morte de seu fundador, aos 98 anos.
O desfile acontece na noite desta segunda-feira na sede do Partido Comunista Francês, um prédio assinado por Niemeyer. Com sua sala de conferências com ares de nave espacial, a construção de formas arredondadas, que poderiam muito bem estar em alguma das ruas de Brasília, é frequentemente solicitada para eventos privativos. Outras marcas de moda já organizaram desfiles e até campanhas publicitárias em seus corredores, com produções bem distantes do projeto ideológico dos construtores do prédio.
Futurismo e conquista espacial
A polêmica do desfile Cardin não está na escolha do prédio, mais sim na gestão do legado do costureiro. Desde a morte de Cardin, a direção artística da marca está nas mãos de Rodrigo Basilicati-Cardin, sobrinho-neto do fundador, que mesmo sem ser estilista, supervisiona as coleções desenhadas por um grupo de colaboradores que já atuavam no estúdio parisiense.
A estreia de Rodrigo Basilicati nas passarelas foi em janeiro de 2022, em um desfile grandioso no aeroporto Bourget, nos arredores de Paris, onde fica o Museu do Ar e do Espaço. Batizada de "Cosmocorps 3022", a coleção de alta-costura foi apresentada ao ar livre, na pista de pouso, diante de um foguete que impressionou as centenas de convidados.
Em março deste ano aconteceu um novo desfile, desta vez no calendário do prêt-à-porter, marcando a volta da marca, que há anos não desfilava na programação oficial. Em ambas as ocasiões, o sobrinho investiu o universo futurista que fez a fama do tio desde a década de 1960, quando Pierre Cardin surfou na conquista espacial para atrair sua clientela jovem.
Suspeita de fraude e abuso de confiança
Desta vez, o burburinho está muito mais concentrado nos bastidores da Maison Cardin do que na passarela. Rodrigo Basilicati é alvo de uma investigação por suspeita de fraude e de ter abusado da idade avançada do tio para assumir a direção da marca após sua morte. As queixas foram apresentadas pela própria família de Pierre Cardin.
O costureiro, que não teve filhos, deixou uma herança milionária. Além de um importante patrimônio imobiliário, ele era o único dono de sua holding e várias filiais – cujos ativos são estimados em mais de € 800 milhões –, assim como os inúmeros contratos de licenciamento de marca – um dos segredos do sucesso de Cardin, um dos primeiros estilistas a emprestar seu nome para produtos derivados.
As sobrinhas-netas do costureiro, que desde sua morte brigam para que a marca seja vendida, acusam Rodrigo Basilicati de “tentativa de espoliar a herança” de Cardin e contestam o testamento que o coloca como único herdeiro. Já o sobrinho-neto, que se tornou diretor-geral do grupo em 2018, antes de assumir a presidência em 2020, diz ter trabalhado quase 25 anos com o tio-avô e que deseja apenas “respeitar os desejos de Pierre Cardin, preservar o seu império e defender a sua imagem”. Em meio a essa briga de família, o que vai ser apresentado na passarela corre o risco de ficar em segundo plano.
A Fashion Week parisiense vai até 3 de outubro. Até lá, 67 desfiles e cerca de 40 apresentações estão previstas na programação oficial.
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