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Avignon/Teatro

Transgêneros ovacionados no maior festival de teatro da França questionam binarismo homem-mulher

Clara, Sandra, Leyre, Raúl, Ian, Dany e Neus entram no palco e se apresentam: mulheres e homens catalães, durante muito tempo vítimas de uma identidade de gênero atribuída pela sociedade, prisioneiros de corpos que não eram os seus.

TRANS (MES ENLLA). de Didier Ruiz
TRANS (MES ENLLA). de Didier Ruiz © Christophe Raynaud de Lage / Festival d'Avignon
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Eles são os sete personagens da peça “Trans”, de Didier Ruiz, em cartaz no Festival de Avignon, cuja programação esse ano é dominada pelas questões de gênero. Longe dos clichês que ligam os transsexuais aos cabarés e à prostituição, todos têm uma vida familiar, profissional e social, como o resto dos mortais. Mas ousaram uma transição que ainda desperta medo na sociedade.

Dignidade e Determinação

A mais jovem, Leyre, tem 22 anos e é estilista. A mais velha, Clara, desenhista industrial, tem 60 e acaba de viver a sua transição. Para criar essa peça, o diretor franco-espanhol Didier Ruiz entrevistou 32 trans, mas decidiu selecionar sete que mais o sensibilizaram, pois são “admiráveis pela dignidade e determinação” – diz ele.

Todos passaram por muitas dificuldades, mas conseguiram finalmente um equilíbrio. O cineasta Ian, antes Rosa Maria, passou por um processo complexo com seus pais, que finalmente hoje são seus melhores amigos.

Clara, antes Laurent, casada e pai de dois filhos testemunha: “Eu encontrei minha mulher quando tinha 18 anos. Vivemos muitos anos juntos e ela sabia que eu me vestia às vezes de mulher. Ela pensava que eu era um homem que se vestia de mulher. Decidi acabar com essa mentira. Mas é incrível pensar que há seis meses ainda éramos casados”.

“Olharmos nos olhos das pessoas e não o sexo delas”

Raúl Roca, antes Laura, fala sem rodeios: “Eu sou um homem e não tenho pênis. Não precisamos ter um pênis para ser um homem”. Com muito humor, o jovem cineasta Ian observa que hoje em dia quando ele entra em um restaurante com a sua mãe ou sua companheira “é para mim que eles dão a conta. Isso nunca acontecia quando eu era Rosa Maria” – brinca ele.

Didier Ruiz afirmou em entrevista coletiva à imprensa em Avignon que essas pessoas –vistas às vezes com desprezo ou compaixão – estendem a nossa visão do mundo. “Elas nos obrigam a sair do sistema binário, homem ou mulher, e nos convidam a olharmos elas nos olhos e não o sexo delas”.

Será que eles não são finalmente o exemplo absoluto da liberdade total?

“Será que eles não são finalmente o exemplo absoluto da liberdade total?” – se interroga o diretor. Ruiz observa que desde o início dos ensaios ficou surpreso pela sensação que eles transmitem. “Eles têm consciência de terem conseguido a liberdade, de estarem agora em plena sintonia com eles mesmos”- diz. Daí o subtítulo da peça (Més enllà), que em catalão significa “além de”.

“Trans” representa uma continuidade do trabalho de Ruiz que busca com seu “teatro-documentário” reunir testemunhos de setores “incompreendidos” da sociedade. Ele coloca geralmente no palco não profissionais que contam a sua própria história. Esse trabalho já foi feito com operários, adolescentes, cientistas, ex-presidiários e agora transgêneros.

Um teatro que se propõe a mostrar o mundo em sua extrema complexidade e que incita os espectadores a abandonarem alguns preconceitos e ganharem em tolerância. Aposta vencida agora em Avignon.

“Trans” (Més enllà) fica em cartaz no Festival de Avignon até 16 de julho próximo. Em turnê em vários teatros europeus, até maio de 2019.

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