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Cinema

“Cine São Paulo” vence prêmio de melhor documentário no festival de Biarritz

Muito aplaudido e elogiado no Festival Biarritz América Latina 2017, “Cine São Paulo” obteve na noite deste sábado (30) o prêmio de melhor documentário. Ao receber a recompensa, os diretores Ricardo Martensen e Felipe Tomazelli protestaram contra o governo do presidente Michel Temer.

Feipe Tomazelli (1° à esquerda) e Ricardo Martensen (2° à esquerda), durante entrega de prêmios no Festival Biarritz América Latina 2017 neste sábado (30).
Feipe Tomazelli (1° à esquerda) e Ricardo Martensen (2° à esquerda), durante entrega de prêmios no Festival Biarritz América Latina 2017 neste sábado (30). Daniella Franco / RFI
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Daniella Franco, enviada especial da RFI a Biarritz

“Nós vivemos tempos muito difíceis no Brasil hoje em dia, política e economicamente. Aqueles que hoje, de forma ilegítima, estão no poder querem nos fazer crer que as soluções para nossos problemas passam pelos cortes de verbas em educação e cultura, quando, na verdade, a gente sabe que é exatamente o oposto. Esperamos que a história de luta e resistência desse senhor no nosso filme ajude a inspirar todos aqueles que lutam por acesso à cultura no Brasil e em toda a América Latina”, disse Martensen ao receber o prêmio.

Em entrevista à RFI, ao comentar a recompensa, Tomazelli endossou o protesto. “Primeiramente, fora Temer”, declarou. “Para nós, esse prêmio é muito importante. O ‘Cine São Paulo’ foi um filme realizado sem dinheiro nenhum. Assim como o Seu Chico, tivemos que lidar, nos últimos dois anos, com dúvidas sobre se conseguiríamos chegar até o fim desse projeto. Vê-lo sendo reconhecido mexe muito com a gente”, disse, emocionado.

Segundo o júri de Biarritz, a escolha de “Cine São Paulo” como melhor documentário se deve à uma produção filmada “de forma astuciosa mas com muito bom humor, fazendo a relação entre a história de um homem e de um cinema”.

O cuidado e a delicadeza dos documentaristas com o personagem do filme, Seu Chico, também foram características elogiadas pelo júri. “Os dois diretores desenvolveram uma relação de carinho, de humanidade, de cumplicidade e de autenticidade com um personagem tocante, um verdadeiro personagem de cinema documentário, forte, engraçado, sensível e obstinado: uma obra muito bem-sucedida.”

Francisco Augusto Prado Telles, o Seu Chico

A reforma de um cinema dos anos 40, fechado pela prefeitura de Dois Córregos (SP), é o tema central do documentário dos dois jovens cineastas. A produção retrata o duro e longo trabalho do professor aposentado Francisco Augusto Prado Telles, o Seu Chico, na tentativa de reabrir a sala que herdou de seu pai.

O personagem, aliás, conquistou o público no festival de cinema latino-americano de Biarritz com sua perseverança e espontaneidade. Durante meses, Martensen e Tomazelli acompanharam a saga do homem que não se deixa vencer por inúmeras dificuldades e burocracias. Ele investe seu tempo, energia e economias para reabrir a sala de cinema que foi o centro da vida cultural de Dois Córregos, durante décadas.

O local tem um valor imensurável para Seu Chico: foi onde passou sua infância ao lado do pai - proprietário e projecionista da sala -, onde começou a trabalhar, palco do namoro com a futura esposa, e que se tornou um “negócio de família” - como o próprio personagem classifica durante o filme, ao mostrar uma antiga gravação em que recebe o público ao lado da mulher e filhos, nos anos 80.

Martensen contou que conheceu Seu Chico em 2011, quando realizava uma série de documentários no interior de São Paulo. Mas foi em 2015, ao conversar por telefone com o aposentado, que o documentarista soube que o cinema de Dois Córregos havia sido interditado pela prefeitura e que a aventura da reforma para a reabertura do local começaria.

Os dois cineastas retratam a obstinação e as dificuldades para a adequação do local às normas de segurança, mas com a insistência de Seu Chico em não abrir mão do equipamento original: o velho projetor, os assentos de madeira, a decoração art nouveau, os letreiros dos anos 40. Mas, de heróis do aposentado, Martensen e Tomazelli passam a figurar no território inimigo do personagem, quando ele atribui aos documentaristas a responsabilidade de a inspeção da sala de cinema ter sido reprovada pelos bombeiros, depois de meses de trabalho de reconstrução. 

“Quando houve esse rompimento, imaginamos que seria uma coisa pontual. Mas um pouco desta situação partiu de uma provocação nossa porque queríamos imprimir isso narrativamente. Não foi algo que partiu só do Seu Chico”, conta Tomazelli.

Seu Chico, personagem retratado no documentário "Cine São Paulo".
Seu Chico, personagem retratado no documentário "Cine São Paulo". Divulgação

De documentário a projeto

Por trás do cativante documentário, um grande projeto dos dois cineastas: uma plataforma de mapeamento de salas de cinema antigas por todo o Brasil. A ideia surgiu a partir de encontros que o filme propiciou à dupla.

O projeto ainda está sendo testado, mas funciona de forma colaborativa. Voluntários acessam uma espécie de mapa, colocam endereço, informações e fotos da sala de cinema, em funcionamento ou não.

Para os documentaristas, o projeto pode se transformar em um catalisador de políticas públicas para restauração. “O documentário é como se fosse um gatilho para a gente poder ‘surfar na onda’, construir um diálogo maior com o público e o filme ter essa espécie de continuação através dessa plataforma”, diz Tomazelli.

A previsão é que o lançamento comercial de “Cine São Paulo” aconteça no primeiro semestre de 2018. Martensen e Tomazelli planejam a realização da grande première do filme no próprio cinema de Seu Chico.

 

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