O mundo cada vez menos opaco dos lançadores de alerta
A Gaité Lyrique, um espaço multimídia dedicado à cultura e arte digitais, organiza em Paris uma exposição atípica sobre a figura ultracontemporânea do lançador de alerta.
Publicado em: Modificado em:
Ouvir - 05:11
Instalações, performances e espetáculos foram realizados por artistas extremamente familiarizados com as artes digitais e que utilizam, por vezes, os mesmos métodos utilizados pelos hackers.
O objetivo da exposição não é exatamente o de explicar quem são eles e de que modo os lançadores de alerta se infiltram em dados ultrassecretos. A intenção primordial é a de sensibilizar o público e denunciar algumas das anomalias existentes em nosso sistema democrático.
A especialista em novas tecnologias e comissária da exposição, Marie Lechner, explica que o lançador de alerta é uma figura que tem interpelado a sociedade. Ela afirma que a ideia não é transformá-lo num herói, mas, sobretudo, provocar uma reflexão quanto às disfunções que eles revelam a respeito do sistema.
Lechner cita, como exemplo, temas ligados à vigilância, ao exílio fiscal, ao lugar ocupado pelos serviços secretos na sociedade, enfim, a todos os aspectos que nos interrogam cada vez mais. “Os artistas que fazem parte da exposição abordaram a temática de modo artístico e estético.”
Uma das instalações mais ousadas, “Call-a-spy”, foi realizada pelo coletivo alemão Peng. O grupo - constituído por ativistas, artistas, cientistas e filósofos - utiliza o hacking midiático e a sabotagem cultural com o único intuito de provocar a desobediência civil e provocar mudanças no discurso público.
Através de um call center, o visitante é convidado a telefonar a um dos serviços de espionagem de países como o Canadá, França, Alemanha e Estados Unidos. A instalação, uma mistura de performance artística e militantismo, serve para desmistificar os serviços de inteligência.
Julien, um dos artistas do coletivo, justifica a iniciativa: “Isso permite quebrar o muro existente entre o público, ou seja, a sociedade civil, e os serviços secretos. Nós não sabemos ao certo o que se passa no interior desses serviços. O artista sugere que a sociedade civil não conhece as leis que favorecem os serviços secretos, sobretudo, após os ataques terroristas sofridos pela França, que ainda se encontra em estado de emergência."
De acordo com a comissária da exposição, as reações dos agentes são variadas, às vezes até simpáticas. Durante a vernissage, um pai que estava acompanhado de seu filho pequeno ligou para os serviços secretos alemães e pediu conselhos para que seu filho pudesse exercer a profissão de espião. O agente alemão respondeu ao pai que eles deveriam se dirigir ao serviço secreto francês, pois ele tinha percebido que seu interlocutor tinha sotaque francês.
Uma outra instalação surpreendente se chama “Assange’s Room”. Trata-se de uma réplica exata do quarto de Julian Assange, fundador da Wikileaks, recriada pelo coletivo berlinense !Mediengruppe. “Chelsea’s Wall” é a parede onde foram projetados alguns dos tuítes da militar americana Chelsea Manning, feitos na prisão militar de Fort Leavenworth.
Já o coletivo de artistas (La)Horde, aproveita o espaço oferecido pela Gaité Lyrique e divulga uma versão de sua plataforma feita sobre a dança pós-internet e o trabalho de jovens dançarinos do mundo inteiro.
A artista grega Danae Stratou apresenta suas “Black Boxes”, que fazem referência às caixas-pretas dos aviões. A artista afirma que esses equipamentos nos ajudam a compreender as razões das catástrofes, mas, infelizmente, tarde demais.
No caso dessa instalação, as caixas-pretas contêm palavras que definem aquilo que mais nos aterroriza ou algo que precisa absolutamente ser protegido. Desse modo, as caixas-pretas da artista revelam preocupações profundas do público.
A exposição “Lançadores de alerta” fica em cartaz até o dia 29 de janeiro de 2017.
NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.
Me registro