Le Monde critica manual escolar que faz propaganda do agronegócio nas escolas do Brasil
O site do jornal Le Monde desta quarta-feira (30) traz uma matéria sobre o manual "Agro para Estudantes", um encarte destinado às escolas do Brasil. "Bem-vindos ao maravilhoso mundo do agronegócio brasileiro!", ironiza o jornal.
Publicado em:
A correspondente do diário no Rio de Janeiro, Anne Vigna, lembra que o material foi elaborado pelo movimento "De olho no material escolar" para a Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep). Entrevistado pelo Le Monde, o presidente da instituição, Ademar Pereira, afirma que o objetivo é fazer com que a visão do agronegócio evolua, já que a imagem do setor, segundo ele, é frequentemente prejudicada por "uma ideologia de esquerda".
A iniciativa da elaboração do manual partiu de duas mães brasileiras, Leticia e Helen, que fazem parte da família Jacintho, detentora de uma das maiores empresas de agropecuária do Brasil. A cartilha trata de técnicas do setor, da agricultura digital, modificação genética e, sobretudo, de preservação ambiental.
Para o diário Le Monde, o movimento "De olho no material escolar" lembra o Escola Sem Partido, que ganhou notoriedade em 2014, quando um grupo de pais e mães passou a classificar o ensino de temas como educação sexual, ditadura militar e escravidão como ideológicos, segundo eles, com o objetivo de "doutrinar" as crianças.
A matéria destaca que cerca de 60 projetos do Escola Sem Partido foram apresentados na esfera local e federal para que os alunos denunciassem professores que fizessem "doutrinação". No entanto, todos os projetos de lei foram julgados como inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal. "Mas estragos foram feitos e não sabemos hoje quantos professores foram atacados, e até agredidos, nas salas de aula", afirma o texto.
Apoio do governo Bolsonaro
O jornal também salienta que a criação do encarte "Agro para Estudantes" foi explicitamente apoiada pelo governo de Jair Bolsonaro. Leticia e Helen Jacintho foram inclusive recebidas pessoalmente pelos ministros brasileiros da Educação e da Agricultura e a cartilha pode entrar no programa nacional de livros didáticos. Para isso, a dupla conta com a ajuda de grandes grupos do agronegócio brasileiro.
Le Monde lembra que o Brasil "é o primeiro consumidor mundial de agrotóxicos" e que o "desmatamento e o trabalho escravo bateram todos os recordes em 2021".
A reportagem destaca que os cientistas que estudam os impactos ambientais e os jornalistas que os revelam são frequentemente atacados pelo agronegócio. "O temor é que um dia o trabalho deles também seja banido dos livros escolares", finaliza o texto.
NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.
Me registro