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Fato em Foco

STF pode descriminalizar porte de drogas nesta quarta-feira

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O Supremo Tribunal Federal avalia hoje a constitucionalidade da lei que pune quem compra, guarda ou porta drogas para consumo próprio. Hoje, no Brasil, essas infrações não são passíveis de pena de prisão, mas podem fazer as pessoas perderem a condição de réu primário. Ao avaliar a validade da punição, o STF decidirá se o problema do uso de drogas pertence à esfera da segurança pública ou da saúde.

Marcha da Maconha, em Juiz de Fora (MG) em 2012.
Marcha da Maconha, em Juiz de Fora (MG) em 2012. Flickr/Coletivo Sem Paredes FdE
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Esse debate chegou ao Supremo em 2011, pelo caso de um presidiário de 50 anos que, dois anos antes, havia assumido três gramas de maconha encontradas na cela que ele dividia com 33 outros presos numa prisão de Diadema, na Grande São Paulo. Ele foi condenado a dois meses de serviço comunitário, mas a defensoria do Estado contestou a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas, no qual ele foi enquadrado. Para a defesa, esse texto violaria os princípios da intimidade e da vida privada.

O sociólogo e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Paulo Cesar Fraga endossa essa versão e afirma que “a descriminalização das drogas significa considerar que as pessoas podem fazer uso de determinadas substancias e que isso não deve ser crime porque é um crime sem autor. Você não tem vítima, a vítima seria a própria pessoa”.

Da segurança pública à saúde pública

No começo da semana, o ministro do Superior Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso afirmou durante palestra no Instituto Fernando Henrique Cardoso, que a criminalização do consumo de maconha "não se justifica em termos de proteção da segurança pública". "A política de guerra às drogas, o tratamento dessa questão como uma questão puramente de segurança pública e bélica, não funcionou em nenhuma parte do mundo", atestou.

Para o advogado e militante da Associação Cultural Cannábica de São Paulo, Fernando da Silva, o STF está prestes mudar essa filosofia: “O uso de drogas, o porte de drogas para uso pessoal não são algo tão grave que mereça ser tratado pelo direito penal”, afirma. “A melhor política para lidar com isso é uma política de saúde pública, uma política de educação, de cultura, de informação e não uma política de polícia, de colocar o usuário na delegacia”, completa.

O porte de drogas pelo mundo

Em Portugal, desde 2001, o usuário de drogas deixou de ser criminoso para ser paciente. Quem for flagrado com drogas comete uma "infração administrativa" e pode ser encaminhado para uma "Comissão de Dissuasão", que é responsável por avaliar o nível de dependência e o tratamento necessário para abandonar o vício. Usar drogas em locais públicos continua proibido.
A Holanda, ao contrário do que pensa o senso comum, não legalizou as drogas, mas aumentou sua tolerância à maconha em uma tentativa de separá-la dos demais entorpecentes. A partir daí, foi liberada a existência dos famosos “coffee shops”, onde usuários podem comprar e fumar tranquilamente. O tráfico, a venda e até o cultivo continuam ilegais, assim como a porte, mas a polícia e os tribunais costumam ser tolerantes.

O Uruguai é o primeiro país da América Latina a comprar a briga e o primeiro do mundo a legalizar o cultivo, a venda e o consumo para uso recreativo, em uma resposta, segundo o próprio governo do ex-presidente José Mujica, ao crescimento de cartéis de narcotráfico na região. Para Fraga, apesar de “muito interessante”, a política serve de inspiração, mas não de modelo: “cada país deve buscar o seu modelo”, defende.

Mesma luta, outras táticas

Uma das grandes dificuldades no processo, é debater o assunto com a sociedade, vítima de muitas maneiras diferentes do mercado da droga e dela própria. Para Silva, é preciso deixar claro que quem pede a legalização tenta seguir outro caminho: “A tentativa de eliminar da face da terra as drogas, não deu certo. O consumo de drogas aumentou, a potência das drogas aumentou e o número de pessoas com problemas de saúde também aumentou, porque essas pessoas não têm a quem recorrer”, observa.

Um dos maiores problemas para enfrentar o problema do tráfico no Brasil é tipificar os crimes e punir ou absolver determinados atores. Na região do “Polígono da Maconha”, no nordeste brasileiro, centenas de agricultores sertanejos, sem alternativas viáveis de emprego, acabam trabalhando, sozinhos ou com a família, em pequenas plantações da droga.

Segundo Fraga, isso acontece porque, com o reforço de repressão da Polícia Federal, que identifica as plantações por imagens de satélite, as famílias são convidadas a manter pequenos plantios da erva, voltando a um esquema de agricultura familiar que já havia se perdido na região. Assim, expande-se o cultivo para outros Estados, como Piauí e Ceará. A identificação desses agricultores como traficantes enche as prisões e não atinge os grandes chefes do tráfico, que se protegem através de intermediários.

Na próxima segunda-feira (24), a Associação Cultural Cannábica de São Paulo promove o primeiro congresso online sobre a descriminalização das drogas. De acordo com Fernando Silva, além de discutir o uso recreativo e medicinal da maconha, o encontro deve tratar a importância de um discurso “desapaixonado” que trate também “os riscos e os perigos da legalização”.

 

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