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O Mundo Agora

Opinião: Novos líderes querem atacar velha mentalidade clientelista e rentista da América Latina

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Mais uma... Desta vez em El Salvador. O candidato Nayib Bukele atropelou todos os caciques e os grandes partidos tradicionais para vencer as eleições presidenciais no primeiro turno. A campanha de Bukele foi igual a de outros presidentes recém-eleitos na região: uma luta impiedosa contra os corruptos da velha classe política e medidas radicais para resolver os problemas econômicos e sociais. Nada de ideologias. Simplesmente resultados.

Nayib Bukele, o novo presidente salvadorenho que venceu as eleições ao obter mais de 53% dos votos.
Nayib Bukele, o novo presidente salvadorenho que venceu as eleições ao obter mais de 53% dos votos. REUTERS/Jose Cabezas
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O jovem presidente aplicou as receitas usadas por uma batelada de políticos da região que vêm chegando ao poder com ideias semelhantes. E nada a ver com as velhas categorias de “direita” e “esquerda”.

A mesma via já foi trilhada pelo argentino Maurício Macri, o mexicano Andrès Manuel López Obrador, passando pelo peruano Martín Vizcarra, ou o Jair Bolsonaro. Na Guatemala, a candidata Thelma Aldana, ex-procuradora geral da República, tem tudo para repetir o feito. Mesmo um com partido formado há dois meses atrás.

Uma mudança profunda está acontecendo na política regional. Não é a velha lengalenga da gangorra que passa da esquerda para a direita. Certamente, todos esses novos líderes – ou velhos dirigentes modernizados – estão propondo políticas econômicas que privilegiam a criação de riquezas para poder distribuí-las.

Junto com os atuais presidentes do Chile, Paraguai e Colômbia, eles são todos acusados de “neoliberais” só porque pretendem chegar lá abrindo as economias nacionais à concorrência, acabando com os déficits públicos alucinantes, incentivando os empresários a investir na competitividade e cortando a selva de regulações e entraves burocráticos que alimentam a corrupção e impedem o desenvolvimento.

Sem economias dinâmicas, não haverá nunca dinheiro suficiente para programar políticas sociais públicas eficientes.
 

Combater privilégios

Na verdade, qualquer que seja o passado ideológico de uns e outros, todos querem atacar a velha mentalidade clientelista e rentista que viceja nas sociedades latino-americanas. Um corporativismo que acabou engolindo tanto os meios empresariais quanto sindicais ou as associações populares.

Uma cultura do toma-lá-da-cá que levou o subcontinente ao ápice dos esquemas de corrupção, com regimes populistas irresponsáveis – qual sejam seus matizes ideológicos – incapazes de resolver os problemas mais básicos das populações.
É óbvio que as situações são bastante diferentes em cada país.

Mas todos tem que enfrentar desafios análogos. Produzir resultados rápidos é uma tarefa urgente. As populações da região, cada dia mais urbanizadas, informadas e conectadas, não estão a fim de esperar muito tempo. E o resto do mundo, então, não está nem aí... Nenhum dos países latinos tem hoje condições de participar na revolução digital global e nas novas maneiras de produzir e consumir.

O abismo está crescendo, assustadoramente, entre uma América Latina dependente da exportação de matérias primas e de alguns bens de baixo valor agregado, e o mundo das tecnologias da informação, da produção robotizada e dos serviços altamente valiosos.

O perigo é simplesmente acabar no lixo da história. Só que não vai ser fácil combater e vencer tantos privilégios e vantagens adquiridas ao longo das décadas de clientelismo e corrupção. O “velho mundo” vai resistir e quase todos os novos presidentes estão longe de ter maiorias parlamentares para aplicar seus programas. A boa notícia é que em todas as sociedades da região existe uma nova geração de juízes e procuradores que querem tentar acabar com a bandalheira generalizada.

E que boa parte das populações, cansada de tanta incompetência e roubalheira, está convencida que é preciso tentar políticas diferentes. Hoje, o grande trunfo dos novos dirigentes são as redes sociais, que muitos já utilizaram para se eleger contra os velhos interesses políticos.

As redes podem ser um poderoso instrumento para pressionar parlamentos, cada vez mais fragmentados, a votar as reformas necessárias. O problema é que também podem servir para sabotar a ação de qualquer governo.

O futuro da América Latina está pendurado nessa tão contemporânea briga de foice no escuro no Facebook ou no WhatsApp.

Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica de geopolítica às segundas-ferias para a RFI

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