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Linha Direta

Substituta de Moro participa de encontro de juízes em Buenos Aires

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Pela primeira vez nos seus 46 anos de história, a Associação de Juízes Federais brasileiros (AJUFE), faz o seu encontro anual fora do país. Até domingo, mais de 300 juízes federais do Brasil, incluindo os ministros do STJ e do STF estarão em Buenos Aires.

A juiza Gabriela Hardt
A juiza Gabriela Hardt Reprodução/Ajufe
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

O objetivo do encontro é reunir os magistrados federais brasileiros e argentinos para compararem as legislações de ambos os países, para trocarem conhecimentos e para analisarem a cooperação jurídica internacional como forma de combater os crimes transnacionais.

O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, abre o encontro com uma palestra na Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires. Antes, o ministro visitará a Corte Suprema argentina. A essa escolha de Buenos Aires para o primeiro encontro fora do país aconteceu em dezembro do ano passado. Os magistrados queriam um encontro internacional que permitisse a integração com juízes de outros países para trocarem experiências e para conhecerem realidades e sistemas jurídicos diferentes.

Buenos Aires foi escolhida por uma questão de conectividade aérea com diversas cidades brasileiras, de proximidade com o Brasil e de infra-estrutura em hotelaria. Porém, coincidentemente, desde que a Argentina foi escolhida, os crimes também permearam a fronteira entre os dois países. Nesse período, a Odebrecht fez uma delação em que confessou ter pago subornos em países da região, incluindo a Argentina. Traficantes brasileiros têm cruzado a fronteira com argentina. E agora, quem antes era juiz e será ministro da Justiça, Sérgio Moro, já avisou que vai atrás do crime organizado, um crime também transnacional.

Temáticas bilaterais

Os juízes brasileiros pretendem abordar com os seus colegas argentinos os sistemas processuais dos dois países, a análise dos sistemas penais, os crimes que atravessam as fronteiras (corrupção, tráfico de drogas e de armas) e a cooperação jurídica entre ambos os países para combater esses crimes.

Hoje, a criminalidade não tem mais fronteira, mas os sistemas legais, sim. E desse atraso, nutrem-se os criminosos. Diferentemente da Europa, os criminosos atravessam a fronteira entre Brasil e Argentina ou Paraguai, livrando-se das leis do país que deixaram, onde praticaram o crime. Nem os sistemas de Justiça têm um único padrão nem as Polícias têm uma atuação unificada. Traficantes, contrabandistas e corruptos transferem montantes em dinheiro com sistemas bancários transnacionais, mas a atuação da Justiça é apenas nacional.

"Hoje a criminalidade não tem mais fronteira. Precisamos ter, dentro do modelo de persecução criminal, mecanismos próprios para perseguir ou para buscar o caminho do dinheiro. Toda a criminalidade organizada, seja de corrupção, contrabando, tráfico de drogas ou tráfico de armamentos, está baseada num sistema de troca de valores de dinheiro através do sistema interbancário transnacional. O que podemos buscar nesse diálogo com os argentinos é um conhecimento dos nossos sistemas jurídicos para que eles possam ser aperfeiçoados e compatibilizados para que as investigações possam ser compartilhadas, importante para a punição da atividade criminosa", explicou à RFI, o juiz federal Fernando Mendes, presidente da Ajufe.

A lei da "colaboração premiada" brasileira de 2013, popularmente conhecida como "delação premiada", inspirou em 2016 na Argentina a figura do "imputado colaborador", popularmente conhecido "arrepentido". Para os juízes, essas inspirações e aprimorações das leis de um país têm um caminho de mão-dupla.

"Embora eu não possa desde logo antecipar, esse processo é um caminho de mão-dupla. Assim como as nossas experiências podem servir para os colegas argentinos, as deles também podem nos ajudar no nosso aperfeiçoamento legal", indica Mendes.

Substituta de Moro está na Argentina

Sérgio Moro não veio porque agora é juiz exonerado, mas sua substituta, Gabriela Hardt, está em Buenos Aires. O evento acontece num momento em que a Justiça brasileira tem protagonismo no espaço político. O juiz está em plena formação do seu gabinete como futuro ministro da Justiça. Os auxílios-moradia estão no centro do questionamento nacional. O reajuste salarial do Judiciário gera polêmica e aumenta o rombo nas contas públicas.

No âmbito bilateral, a Lava Jato, com as suas ramificações pelos países da região, atinge a Argentina que ainda aguarda a chegada ao país das delações da Odebrecht. Por outro lado, o caso argentino dos Cadernos da Corrupção, uma espécie de Lava Jato argentina, também envolve empreiteiras brasileiras. E agora pode haver um novo elemento: traficantes brasileiros começam a cruzar a fronteira argentina

Uniformização

Se o próximo governo brasileiro realmente combater o crime organizado, pode haver um efeito de fuga de criminosos do Brasil para a Argentina. "A partir do momento em que um país como o Brasil estabelece uma agenda prioritária contra o crime organizado, a criminalidade vai ter que se organizar de maneira tentar fugir do sistema de controle mais rígido. Numa região como a que temos aqui na Tríplice Fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai), isso é muito sensível pela proximidade e pela facilidade de se cruzar uma rua para fugir não só da Justiça, mas das Polícias", avalia o juiz Fernando Mendes.

"Aqui entra o trabalho do Executivo na integração do trabalho conjunto na alteração do nosso quadro legal para que seja aplicado dentro de uma região transnacional, assim como existe na União Europeia", compara. Objetivos dos juízes brasileiros incluem trocar experiências e práticas que possam contribuir no julgamento de casos semelhantes, aprimorar ferramentas de cooperação jurídica internacional e começar um caminho de uniformização de certas áreas do sistema jurídico dos dois países para dificultar a criminalidade seja por corrupção seja por tráfico.

"Vamos ter de caminhar para uma certa padronização porque a criminalidade não tem fronteira, mas enquanto a legislação tiver, isso acabará contribuindo para a criminalidade", conclui Mendes.

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