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Linha Direta

Entenda como os bancos colocam em risco legalização da maconha no Uruguai

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O capítulo mais ambicioso da legalização da maconha no Uruguai, a venda em farmácias de uma produção controlada pelo Estado, corre risco de fracassar. O sistema começou em 19 de julho e foi um sucesso: o número de consumidores quase triplicou. Mas um obstáculo inesperado surgiu como uma ameaça a essa parte mais crucial da legalização: os bancos anunciaram que vão fechar a conta de todos os que comercializarem maconha. Para pressionar o governo por uma solução, uma marcha promete levar milhares de manifestantes às ruas de Montevidéu no sábado (26).

Plantação de maconha no clube canábico Sativa, em Montevidéu.
Plantação de maconha no clube canábico Sativa, em Montevidéu. RFI/Marine de La Moissonnière
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Márcio Resende, correspondente da RFI na Argentina

De onde menos se esperava, surgiu uma verdadeira bomba: os bancos que operam no Uruguai anunciaram que vão fechar as contas de comércios associados à venda de maconha devido às normas da Reserva Federal dos Estados Unidos que proíbem as entidades bancárias de terem relações com empresas vinculadas com maconha. A norma visa evitar a lavagem de dinheiro, mas põe em risco toda a rede da legalização uruguaia já que afeta tanto as empresas que plantam e que distribuem contratadas pelo Estado quanto as farmácias que comercializam o produto. 

O banco Santander, por exemplo, já avisou que os seus clientes têm 30 dias para retirar o dinheiro das suas contas. Uma das farmácias já decidiu sair do sistema. A venda nas farmácias está virtualmente paralisada. 

Até mesmo o banco estatal República se somou à restrição quando foi advertido que ficaria inabilitado para qualquer transação externa como transferências internacionais, operações de comércio exterior ou compra e venda de moeda estrangeira. Assim, a legislação uruguaia ficou à mercê da política financeira norte-americana. 

Manifestação em Montevidéu

Para pressionar o governo por uma saída, uma marcha de protesto acontece neste sábado em Montevidéu sob o lema "Maconha Legal no Uruguai: quem decide é o Estado, não os bancos". O protesto é convocado por ativistas que exigem do governo uma fórmula de equilíbrio entre os direitos dos cidadãos que contam com uma lei e as medidas bancárias de controle. 

Os ativistas acusam os bancos de não respeitarem a soberania do Uruguai. Eles apontam a contradição do sistema porque nos Estados Unidos há jurisdições que também comercializam maconha legal. 

Além das farmácias que já estão afetadas, os empresários estão aflitos porque investiram milhões de dólares na produção de maconha e diversos laboratórios estrangeiros de investigação e produção aterrissaram no Uruguai apostando na fabricação de maconha medicinal para o mundo.

Governo reage a obstáculo

O governo avalia alternativas criativas por fora do sistema bancário, mas nada parece de fácil resolução. O próprio presidente do Banco Central do Uruguai, Mario Bergara, disse que a solução dependeria de uma flexibilização na lei dos Estados Unidos. 

A legalização da maconha foi impulsionada pelo ex-presidente José Mujica, que atualmente é um senador influente do Parlamento. Mujica desconfia da falta de ação do seu sucessor, o presidente Tabaré Vázquez, médico oncologista, quem sempre demonstrou rejeitar a legalização.

O ex-presidente já ameaçou o governo: "Ou encontram uma solução ou não vai sair mais "nenhuma lei do Parlamento".

Sucesso da lei depende do sistema de farmácias

As farmácias são o principal instrumento de combate ao tráfico de drogas. A legalização da maconha no Uruguai tem como objetivo acabar com esse problema, tirando-lhe o mercado.

Além da farmácia, existem outras duas formas de acesso à maconha legal: o cultivo individual doméstico e os clubes canábicos. Para o auto-cultivo, é preciso de espaço, tempo e conhecimento, além de algum investimento.

Em um clube, um sócio desembolsa entre US$ 80 e US$ 120 por mês. Esse custo é o dobro e até o triplo do que custa comprar maconha na farmácia, que é a saída para a classe baixa e média-baixa. 

Cada pacote de 5g na farmácia custa 187 pesos uruguaios, equivalente a cerca de R$ 20. Essa mesma quantidade de maconha vendida pelo tráfico, de qualidade bem inferior, custaria o triplo: cerca de R$ 60. 

As farmácias representam o golpe mais duro no tráfico de drogas. Nesse ponto surge a contradição: as normas bancárias internacionais buscam evitar a lavagem de dinheiro do tráfico, mas, no caso uruguaio, elas estão favorecendo o mercado do tráfico de drogas.
 

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