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Historiador Jeffrey Lesser: “Decreto de Trump pode afugentar cérebros”

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Os Estados Unidos assistem a uma batalha jurídica em torno do decreto anti-imigração do presidente Donald Trump, que suspende temporariamente a entrada de refugiados e cidadãos de sete países de maioria muçulmana. Depois das ações de grandes empresas, principalmente da Silicon Valley, contra a medida, a comunidade acadêmica amplia sua mobilização para evitar que o país deixe de ser atraente para estrangeiros com “mentes brilhantes”.

O historiador e professor da Emory University, Jeffrey Lesser.
O historiador e professor da Emory University, Jeffrey Lesser. Foto: Emory University
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De seu escritório, em Atlanta, Jeffrey Lesser, chefe do Departamento de História da Universidade de Emory, observa com preocupação a disputa jurídica sobre o polêmico decreto anti-imigração assinado pelo presidente Trump e vetado por juízes americanos. Segundo o historiador, a disputa deverá chegar até a Corte Suprema, onde se travará uma longa discussão sobre o poder do presidente de adotar medidas sobre imigração com os chamados “atos executivos”.

Mas os efeitos já são sentidos em todas as áreas, incluindo a do conhecimento. “Estamos em um momento meio complexo, em que o governo não fala de uma só voz. As consequências são imensas aqui”, resume.

Nos dias em que o decreto foi aplicado, muitas universidades dos Estados Unidos tiveram muitos de seus alunos proibidos de voltar ao país, para realizar estudos ou trabalho, por integrarem a lista dos sete países atingidos pela medida: Irã, Iêmen, Síria, Iraque, Somália, Líbia e Sudão.

“A reação é mais ampla. Pessoas de vários países sem cidadania americana estão com medo e avaliando se devem estudar, trabalhar ou fazer pesquisas nos Estados Unidos. Elas também têm medo por seus parentes. Estamos em um momento tenso e essa tensão está cada vez mais aparente”, declarou Lesser na entrevista à RFI Brasil.

Viagem de estudo a São Paulo ficou comprometida

O professor planejou levar em junho deste ano um grupo de estudantes de graduação e pós-graduação da universidade para uma pesquisa de campo no bairro do Retiro, em São Paulo. Mas o programa corre o risco de não acontecer porque muitos alunos, de várias origens e regiões do mundo, hesitam em deixar o território americano.

“Muitos desses alunos que não têm cidadania americana, que são de vários países, têm medo de sair dos Estados Unidos. Não tem a ver com o Brasil exatamente”, explica. “O medo é de perder a liberdade intelectual, deixar um grupo brilhante de estudantes da Universidade de Emory. O medo funciona assim. Alguém tem medo de sair dos Estados Unidos e não conseguir voltar, mesmo vindo de um país europeu”, exemplifica, sem revelar as nacionalidades dos alunos previstos para participar da viagem de estudos à capital paulista.

Como em todas as grandes instituições de ensino superior americanas, o número de estudantes estrangeiros na Universidade Emory é considerado expressivo. Segundo Lesser, são cerca de 25% de alunos de fora dos Estados Unidos matriculados na entidade.

“A porcentagem de alunos que não são dos Estados Unidos é extremamente alta. Nós procuramos os melhores alunos do mundo, das melhores universidades. Não estamos preocupados de onde eles vêm e que religião seguem. Estamos interessados em saber se eles são brilhantes”, explica.

Prejuízos na imagem a curto e longo prazo

A preocupação aumenta nesse período em que muitos alunos estrangeiros se preparam para fazer a inscrição em uma universidade americana para frequentar as aulas a partir de setembro. “Parece que muitos alunos desses setes países (alvos do decreto) vão ter um convite para entrar na Emory porque são brilhantes. E todos agora estão com medo de que esses alunos não venham, que serão proibidos (de entrar no país). Isso é ruim para todos nós, quer dizer que vamos deixar de ter alguns alunos brilhantes”, lamenta.

“No curto prazo, cada vez que uma universidade, uma empresa ou comunidade deixa de contar com os melhores, é ruim. No longo prazo, nós temos medo de que certas pessoas decidam não mais vir para os Estados Unidos, estudar ou trabalhar”, acrescenta.

“As memórias ficam por muito tempo. Se os Estados Unidos começam a ter uma imagem de anti-imigração, anti-estrangeiro, anti-islâmico, isso vai prejudicar os Estados Unidos em todas as áreas, inclusive econômica. Por isso, a preocupação de tantas empresas como a Google, AirBnb, entre outras, com esses atos executivos”, reforça.

Brasileiros têm boa imagem

Especialista em imigração no Brasil, com vários artigos científicos e livros dedicados ao temo, o historiador não percebeu ainda uma movimentação em relação à comunidade brasileira, que desfruta, segundo Lesser, de uma imagem positiva nos Estados Unidos.

“Em geral, nos Estados Unidos, tanto os brasileiros quanto seus filhos e netos americanos de ascendência brasileira, são uma minoria bastante quieta. Em parte porque é uma minoria bastante bem vista no país”, afirma.

“Mas todo grupo étnico migratório tem um certo medo que é: ‘o próximo pode ser eu’. Apesar de não ouvir muito da comunidade brasileira em Atlanta, que é muito grande e presente, no aspecto político não estamos ouvindo muito, pelo menos por enquanto. Mas isso pode mudar”, observa.

 

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