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O Mundo Agora

Trump enfrentará intensa batalha política interna nos EUA

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Antes da eleição de Donald Trump, a moda na globalização era a ideia do “mundo plano”. Mas pelo visto, estamos entrando num “mundo íngreme”. O mundo “plano” era horizontal, aberto, interconectado, com as economias pobres e ricas convergindo num mercado mundial assentado em regras universais.

Donald Trump durante uma visita à sede da  CIA, em 21 de janeiro de 2017.
Donald Trump durante uma visita à sede da CIA, em 21 de janeiro de 2017. REUTERS/Carlos Barria
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Uma ordem global cosmopolita, afiançada pelo poderio americano, com governos nacionais – até o dos Estados Unidos – virando simples administradores locais. No bom caminho da inovação permanente, da democracia e da liberdade do comércio todos acabariam ganhando. Só que os eleitores de Trump, a massa de trabalhadores brancos das velhas indústrias obsoletas e dos grotões interioranos, não pensam desta maneira. Para o magnata do topete dourado a vida internacional é um jogo de soma zero: só há vencedores a custo de perdedores.

O sonho trumpiano de “restabelecer a grandeza da América” significa que os Estados Unidos não querem mais saber de “ganha-ganha”. Não vai ter colher de chá para mais ninguém: o jogo é ganhar, se possível tudo. E os outros que se virem. O que conta são os interesses imediatos. Nada de mercado mundial regulamentado, nem grandes esquemas multilaterais, mas acordos comerciais bilaterais onde a potência americana impõe suas condições.

Nada de garantir a segurança da ordem internacional ou dos aliados. Eles que paguem a conta e façam os sacrifícios econômicos e militares necessários. E se algum problema ameaçar diretamente os interesses americanos, a resposta será um colossal murro na mesa. A visão de Trump é o “mundo íngreme”, vertical, hierarquizado, onde só é bom o que é bom para os Estados Unidos – sobretudo para a sua base eleitoral. E quem não gostar vai se dar mal.

Ninguém sabe ainda se tudo isso não é um gigantesco blefe. Trump é um homem de negócios e sabe muito bem que não há negócio sem que o parceiro também ganhe alguma coisa. Aliás, o novo secretário do Comércio, Wilbur Ross, já declarou que começar o jogo “com o adversário sabendo que vai ter que fazer concessões, já é um bom ponto de partida”.

Discurso de posso "duríssimo"

E os secretários da Defesa e da Segurança Interna já declararam abertamente que garantir as alianças internacionais era fundamental para a segurança dos Estados Unidos. O discurso inaugural do empreiteiro bilionário, clamando que agora tudo será “primeiro a América” foi duríssimo. E algumas coisas – bem desagradáveis para a oposição interna e para o resto do mundo – ele vai ter que entregar para seus partidários.

Só que um presidente americano não é tão poderoso assim. As gigantescas manifestações contrárias, um dia apenas após o juramento, mostraram que o país está partido em dois. As grandes cidades e boa parte das cidades médias americanas votaram em Hillary Clinton. Se Trump ganhou no voto indireto dos Estados, ele perdeu o voto popular nacional por uma boa margem. Os setores mais atrasados, fechados, sem futuro – os que votaram em Trump – são minoritários.

Os habitantes das cidades, cosmopolitas, dinâmicas, inovadoras – as pontas de lança da economia e da cultura americanas – são maioria. O magnata louro mobilizou um eleitorado profundamente inquieto, frustrado e pouco educado, que nunca votava. A sua vitória está mobilizando um eleitorado urbano, mais sofisticado, bem educado, e com bons empregos, além de uma maioria de jovens, mulheres, e minorias étnicas ou sexuais que se sentem ameaçadas e que também muitos não votavam.

As próximas eleições legislativas são daqui a dois anos e até os representantes do Partido Republicano, que já pensam na reeleição, não estão a fim de enfrentar uma opinião pública hostil. Sem contar que as ideias de Donald Trump irritam profundamente boa parte do establishment republicano e que os Estados da Federação têm bastante poder para se opor às iniciativas do governo federal. Portanto, desde o primeiro dia, o novo presidente tem que enfrentar diretamente uma maioria do país.

Nos próximos meses haverá, sem dúvida, surpresas na política externa e comercial americana, mas surpreendente mesmo vai ser a escala da violenta batalha política interna nos Estados Unidos.
 

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