Cristina Kirchner quer usar intimação da Justiça para retorno político
Publicado em:
Ouvir - 04:52
Depois de quatro meses afastada da vida pública, a ex-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, reapareceu, mas para prestar depoimento na Justiça. Ela foi intimada no processo que investiga a venda de contratos futuros de dólar a preços muito abaixo do mercado na reta final do seu governo. O depoimento acontece nesta quarta-feira (13).A manobra financeira gerou uma perda bilionária para os cofres públicos e a Justiça quer definir a responsabilidade da ex-presidente que deixou o poder em 9 de dezembro de 2015, após oito anos na presidência. Embora ela esteja cada dia mais implicada em outras investigações, a militância continua fiel. Do lado de fora do fórum da Justiça Federal de Buenos Aires, milhares de militantes vão manifestar apoio incondicional à ex-presidente e Cristina Kirchner fará do interrogatório um verdadeiro comício político.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Para que Cristina Kirchner não deixasse a Presidência em meio a uma desestabilização financeira, no últimos meses do ano passado, o Banco Central argentino vendeu dólares a futuro e vendeu a um valor muito abaixo do mercado. A moeda norte-americana foi vendida a 10 pesos e 60 centavos enquanto no mercado internacional a cotação rondava os 15 pesos. Ou seja: o Banco Central vendeu dólar 42% mais barato.
A Justiça quer definir a responsabilidade de Cristina Kirchner nessa manobra financeira que provocou uma perda entre 4 e 6 bilhões de dólares aos cofres do Banco Central. A operação beneficiou bancos e grandes empresas. A Justiça também analisa quem ganhou para saber se o governo não favoreceu empresários amigos do poder.
Cristina Kirchner pode ser presa?
A chance de Cristina Kirchner ser presa existe, mas é mínima. Os analistas concordam que é muito difícil provar o delito. Mas muitos também acreditam que se um juiz intima uma ex-presidente, é porque já planeja indiciá-la no processo. Kirchner pode alegar que o Banco Central é autônomo e que o governo não previa uma desvalorização posterior da moeda se o seu candidato ganhasse as eleições. Nenhum dos dois argumentos é verdadeiro, mas essa pode ser a defesa dela.
E ela pode usar as escadarias do Tribunal Federal diante de uma multidão de militantes para tornar o interrogatório um ato político de regresso. Kirchner pode se dizer vítima de uma perseguição política, que seus adversários usam a Justiça para tentar impedir que ela tenha força opositora e que volte ao poder no futuro.
Mas o simples fato de a Justiça intimar uma ex-presidente e de iniciar investigações em outros casos é o maior indício de que Cristina Kirchner não tem mais o poder que lhe garantia impunidade.
Outras investigações envolvendo Cristina Kirchner
A ex-presidente está envolvida em pelo menos cinco casos suspeitos. No sábado passado (9), passou a ser investigada por "lavagem de dinheiro" através dos seus quatro hotéis, todos construídos enquanto os Kirchner estavam no poder.
Lázaro Báez, um empreiteiro amigo dela, foi preso na semana passada. O esquema é o mais típico de todos para desviar dinheiro: obras públicas superfaturadas e sempre ganhas pelas empresas do mesmo empreiteiro. Muitos acreditam que o empresário seja, na verdade, sócio dos Kirchner ou até mesmo um empregado da família. A suspeita é que a diferença do valor das obras voltava através de lavagem de dinheiro que usava os hotéis dos Kirchner sempre lotados no papel, mas sempre vazios na realidade.
O esquema de superfaturamento com posterior lavagem de dinheiro também aparece em outras investigações. Numa delas, também foi preso na semana passada o ex-secretário de Transportes, Ricardo Jaime. Perante a Justiça, Jaime disse que não fazia nada sem ordem dos Kirchner.
Reação da opinião pública argentina
Fora as manifestações incondicionais da militância, os argentinos que querem justiça são mais numerosos. O cerco se fecha e Cristina Kirchner está cada vez mais isolada judicial e politicamente.
Hoje haverá uma multidão de militantes em apoio à ex-presidente do lado de fora do Tribunal Federal. A área já está cercada desde ontem (12) à tarde. Milhares vão marchar como forma de pressionar a Justiça e de demonstrar que Cristina Kirchner conta com o apoio popular. Será uma demonstração de força que tenta renovar a sua liderança.
NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.
Me registro